Embrapa Trigo
 
Junho, 2013
142
Passo Fundo, RS
O centeio no mundo

O centeio é o oitavo cereal em termos de área colhida e de produção no mundo (Tabela 2). Sua produção representou, na média do período de 2002-2011, 0,7%[4] da quantidade total produzida de cereais (considerando o milho, o trigo, o arroz, a cevada, o sorgo, o milheto, a aveia e o centeio). Na década de 1960, esta participação foi de 3,4%, quando o cereal ocupou a sétima posição entre esse conjunto de grãos.

Em termos de área colhida, o centeio ocupou 0,93% da área colhida desse grupo de grãos, no período de 2002-2011, percentual que foi quase três vezes superior (3,93%), na década de 1960. Nessa mesma década, a área colhida de centeio correspondia a 12,0% da área total colhida de trigo. Essa relação passou para 5,2%, na década de 1990, e para 2,9%, na média dos últimos dez anos (2002-2011). Segundo Baier (1994), alguns autores estimaram que, em 1900, o centeio ocupou a metade da superfície semeada com trigo.

A Figura 1 e a Tabela 3 apresentam dados sobre a dinâmica do cultivo de centeio no mundo, em termos de produção, uso e comércio. Como pode ser observado na Figura 1, o cultivo de centeio no mundo nos últimos cinquenta anos, apresentou redução em termos de área colhida e de produção obtida. Na década de 1960, a área anual média de cultivo de centeio no mundo era de 25,57 milhões de hectares. Após uma progressiva redução no final dos anos 1960 e inicio dos anos de 1970, a área manteve-se entre 13,3 a 17,4 milhões de hectares entre os anos de 1972 a 1990, vindo a sofrer novas quedas na área cultivada a partir dos anos 1990. Já na primeira década dos anos 2000, a área anual média foi de 7,1 milhões de hectares e, no período de 2010-2012, essa média foi menor que 5,0 milhões de hectares.

A década de 1970, além da expressiva redução da área colhida, também é marcada pelo aumento significativo de rendimento, aumento de mais de quatrocentos quilogramas por hectare quando comparadas as médias de rendimento da década de 1960 e de 1970. Segundo Brümme (2007), o melhoramento de centeio foi significativo nos anos de 1970, com a introdução de variedades híbridas, cujos rendimentos superiores ao das variedades puras independentemente da qualidade do solo, embora haja flutuações anuais em decorrência de condições climáticas. (BRÜMME, 2007). Nestes últimos cinquenta anos, o rendimento médio do centeio aumentou de 1.251 kg/ha (média da década de 1960) para 2.374 kg/ha (média da década de 2000), com maior registro de rendimento, de 2.750 kg/ha, na safra de 2009/10.

No período de 2010-2012, os maiores rendimentos foram registrados na Suíça (6.667 kg/ha), na União Europeia (UE)* (3.327 kg/ha), Noruega (3.327 Kg/ha), Canadá (2.540 Kg/ha) e Turquia (2.532 Kg/ha)[5]. Na União Europeia, países como o Reino Unido (6.634 kg/ha), Luxemburgo (6.235 kg/ha), Uzbequistão (6.110 kg/ha), Suécia (5.654 kg/ha), Dinamarca (5.169 kg/ha) e Alemanha (5.137 kg/ha)[6] foram destaques em termos de rendimento, no período de 2008-2010, segundo os dados da FAO (2012). Destaque deve ser referenciado, à Turquia, à Suíça e à Argentina que apresentaram os maiores incrementos anuais em termos de rendimento, 58,2 kg/ha/ano; 42,1 kg/ha/ano e 34,9 kg/ha/ano[7], respectivamente, no período de 1993-2012 (últimos 20 anos).

Até o início dos anos 1990, os aumentos de rendimento garantiram a manutenção da produção, a ponto de a média anual da quantidade produzida na década de 1980 (29,6 milhões de toneladas) ser próxima à média anual da década de 1960 (31,7 milhões de toneladas), em uma área de quase 10 milhões de hectares menor (Tabela 3). O maior registro de produção de centeio ocorreu na safra 1990/91, com a produção de 36,8 milhões de toneladas em 15,7 milhões de hectares e rendimento de 2.343,5 kg/ha. A partir da década de 1990, houve redução da área semeada com centeio, o que resultou em menor produção, apesar do rendimento crescente. Na década de 2000, a produção média anual foi de 16,9 milhões de toneladas, quase metade da quantidade média produzida nos anos 1960. A safra de 2010/2011 registrou a menor área colhida (4,85 milhões de ha) e menor quantidade produzida (11,4 milhões de ha) dos últimos cinquenta anos.

Alguns autores relataram fatos que auxiliam na compreensão da redução da área de cultivo de centeio no mundo. Gerschenkron (1989), no livro “Bread and democracy in Germany”, relata que o progresso da democracia na Europa foi associado à ampliação do uso de trigo, considerado como alimento de elite, como principal fonte de carboidrato no consumo humano em substituição ao uso do centeio, usado primordialmente pela massa camponesa, considerado alimento mais pobre e como insumo agrícola para produção animal, especialmente, a suinocultura. Vale lembrar que na Idade Média, o centeio foi o cereal panificável por excelência até o final do século XIX, quando foi substituído pelo trigo que possui maior quantidade de glúten e resulta em produto final claro. Já Allen (1996) afirma que uma das principais razões para a queda na área plantada de centeio na União Soviética parece ter sido a falta de variedades anãs de centeio quando do surgimento das colhedoras mecanizadas. Segundo o autor, a palha longa do centeio consistia em problema no processo de colheita mecanizada e, cultivares de trigo mais baixas, disponíveis na época, adaptaram-se melhor ao novo processo.

Como se observa na Tabela 3, o consumo de centeio apresenta tendência de queda. No último triênio (2010-2012), o consumo total anual médio foi de 13,0 milhões de toneladas, sendo 65,2% destinado à alimentação humana, indústria e semente, percentual semelhante à década de 1960. Tradicionalmente, o maior consumo do centeio grão, destina-se à alimentação humana. No entanto, com o aumento da produção na década de 1980, esse perfil de uso do cereal foi alterado, sendo que a alimentação animal e perdas representou metade ou mais da metade, nas safras de 1983/1984 e de 1987 a 1993.

Regionalmente, há variações no perfil de consumo do cereal. Enquanto no Oriente Médio, o consumo de centeio-grão é quase totalmente destinado ao consumo humano, indústria e semente (acima de 95,0%), no Leste da Ásia, o centeio-grão tem sido destinado à alimentação animal (em torno de 90,0%). O consumo para alimentação humana e indústria também é alto nos países da antiga União Soviética e leste da Europa (não integrantes da União Europeia - EU), entre 60,0 a 85,0% do total consumido nesses países é destinado para essa finalidade, embora os países da antiga União Soviética apresentem aumento do uso na alimentação humana nas duas ultimas década, ao contrário dos países europeus não EU. Na EU e na América do Norte, há equilíbrio entre os destinos finais, sem do que 42,0% a 60,0% é destinado para o consumo humano. Nos últimos cinco anos (2008-2012), o consumo humano, industrial e para semente representou 54,6% e 66,0%, respectivamente, nessas duas regiões. Segundo Rye... (2012b), 35% do total consumido na União Europeia são destinados à alimentação humana, 17% para processamento industrial (principalmente a produção de etanol), 44% para alimentação animal e 4% são resíduos. Já na América do Sul e na Oceania, o uso do centeio-grão para alimentação animal tem se ampliado e, nos últimos cinco anos (2008-2012), o consumo animal representou 69,7% e 74,2%, respectivamente, do total consumido nos dois continentes.

No período de 2008-2012, a União Europeia respondeu por 58,8% do consumo mundial do cereal. O consumo nos países da antiga União Soviética[8] totalizou 33,7% do consumo global nesse período, percentual inferior ao observado à média anual na década de 1990 de 47,3%. Segundo Rye... (2012a), o consumo do centeio no bloco difere entre os países. Nos países nórdicos e bálticos, o centeio é tradicionalmente cultivado para a produção de pão. Na Alemanha, o centeio é utilizado para alimentação animal, para panificação e para bioenergia. Estima-se que 900 mil toneladas sejam utilizadas na produção de pães no país e sua utilização como substrato de fermentação para a produção de biogás e para a produção de bioetanol é crescente. Em 2011, 390 mil toneladas de centeio foram transformadas em bioetanol na Alemanha. Na Polônia, um terço da produção é utilizado na panificação, um terço para alimentação animal e o restante para produção de etanol. Na Rússia e na Ucrânia, o centeio é utilizado principalmente para a produção de pão e alimentos para animais. Parte da colheita é exportada na forma de farinha e grãos de centeio.

O comércio internacional do centeio é restrito e pequeno. Na década de 2000, a quantidade média anual exportada foi de 753,0 mil toneladas, o que equivale a 4,4% da produção mundial do cereal. No período de 2010-2012, a quantidade foi ainda menor, média anual de 461,0 mil toneladas (3,7% da produção total). Já na década de 1990, as transações comerciais envolvendo o centeio alcançaram, em média, 7,3% do total produzido. Na safra 1994/95, o total exportado do cereal chegou a 2,7 milhões de toneladas, maior registro de exportação, correspondendo a 12,7% do total produzido.

No período de 1982 a 2004, foram observadas as maiores relações de estoque final e consumo do cereal, chegando a 43,6% na safra 2002/2003. Nos últimos anos (2008-2012), a relação tem variado de 9,2% a 16,3%, o que corresponde a um estoque de passagem médio de 1,9 milhão de toneladas.

A maior parte da produção mundial de centeio está localizada em zonas temperadas frias. No período de 2008-2012, a Europa respondeu por 59,3% do total produzido de centeio, seguida pela Ásia (36,9%) e pela América do Norte (3,2%). Somadas as produções da União Europeia (58,6%), dos demais países do leste europeu (0,7%) e os países da antiga União Soviética (34,6%), observa-se que, aproximadamente, 94,0% da produção mundial nesse período se concentrou no hemisfério norte entre os Montes Urais e o Mar Nórdico.

Até final da década de 1980, a antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) era o maior produtor mundial de centeio, respondendo no período de 1981 a 1990, década anterior a sua dissolução, por 47,6% do total produzido de centeio no mundo. Atualmente, o centeio é uma cultura importante na Polônia e na Alemanha e nas três repúblicas da antiga URSS: Rússia, Bielorrússia e Ucrânia. Esses países respondem por mais de 75,0% da produção mundial de centeio. Na Polônia, nas décadas de 1960, 1970 e 1980, a área colhida de centeio foi superior a de trigo. Na década de 1960, a área de centeio nesse país foi 164,0% superior à área de trigo, mas na década de 2000, embora ainda seja uma cultura de importância para o país, a área colhida do cereal representou 63,7% da área colhida com trigo[9]. Na Alemanha, o centeio já respondeu por 40% da quantidade combinada de trigo e centeio na década de 1960. Na década de 2000, esse percentual foi de 12,8%. Dentre esses países, na Bielorrússia, embora o centeio também tenha perdido importância nas duas ultimas décadas, o centeio apresentou área colhida próxima a área colhida de trigo, variando de 60 a 190% em relação à área colhida de trigo na década de 2000.

Na Tabela 4 são apresentados os principais produtores, consumidores, exportadores e importadores do cereal no mundo. O bloco da União Europeia, conjuntamente, apresenta a maior produção do cereal com quantidade anual média de 8,4 milhões de toneladas, no período de 2008-2012, correspondendo a 58,6% da produção global. O bloco é seguido pelos países da antiga república soviética: Rússia (22,0%), Bielorrússia (7,9%) e Ucrânia (5,1%). Esse conjunto de países responde por mais de 90,0% da produção mundial. No período de 2008-2012, eles foram responsáveis por 93,1% do total produzido de centeio no mundo.

A Polônia e a Alemanha têm sido responsáveis por, aproximadamente, 80,0% da produção do bloco da UE. No período de 2006-2010, a Polônia foi responsável por 39,5% da produção na EU e a Alemanha, por 39,5%[10]. Os demais países do bloco detêm participações menores que 3,0% como a Espanha (2,8%), a Dinamarca (2,2%) e a República Tcheca (2,0%).

Considerando a média anual na década de 2000, segundo os dados da FAO (2012), a Rússia, individualmente, seria o maior produtor mundial (4,17 milhões de toneladas), seguida pela Polônia (3,6 milhões de toneladas) e pela Alemanha (3,4 milhões de toneladas). Se considerarmos somente o período de 2008-2010, a Alemanha assumiu o primeiro posto (3,7 milhões), seguida pela Rússia e Polônia com produções médias anuais ao redor de 3,5 milhões.

Os maiores produtores mundiais também figuram como os maiores consumidores: a UE (58,4%), a Rússia (21,9%), a Bielorrússia (7,4%) e a Ucrânia (4,8%) responderam por 92,4% do consumo mundial no período de 2008-2012. Embora tenha sido observada redução de consumo em todos os países quando comparadas as médias anuais de consumo da década de 1990 e de 2000, em alguns países esta redução foi mais expressiva, como no Cazaquistão (- 85,8%), na Rússia (-46,6%), na Bielorrússia (-34,0%) e no Japão (-29,6%) e, em outros, houve aumento do consumo como na Argentina (+22,2%) e na Turquia (+15,2%).

Nas últimas décadas, tradicionalmente, o comércio mundial do centeio tem sido dominado pela UE-27. No entanto, países como o Canadá, a Ucrânia, a Bielorrússia e a Rússia também são importantes players nesse mercado. Na década de 1960, a antiga URSS detinha quase 50,0% do comércio mundial, seguida pelos EUA (13,5%) e pelo Canadá (12,6%). Na década de 1970, o Canadá foi o principal país exportador, representando 25,2% do total exportado da década, seguido pela Alemanha, EUA, Suécia e Polônia. O Canadá manteve-se como o principal exportador individual na década de 1980 com participação média de 35,1%. Juntamente com a Alemanha (16,6%), a Dinamarca (13,02%), a Bielorrússia (11,2%), a Polônia (10,8%) e a Rússia (9,2%), esse grupo de países perfizeram, aproximadamente, 95% do total comercializado na década de 1980.

Entre 1990 a 2006, a União Europeia dominou o comércio mundial, representando 71,7% e 55,2% do total exportado, nas décadas de 1990 e de 2000, respectivamente, sendo a Alemanha responsável por mais de 50,0% do total exportado pela EU. Países como a Rússia, a Ucrânia e a Bielorrússia passaram a deter participações expressivas nessas décadas, especialmente a partir de 2006, quando houve queda acentuada na participação da União Europeia no mercado internacional.

Nos últimos cinco anos (período de 2008-2012) a exportação média anual foi de 416,4 mil toneladas. Com base no total exportado nesse período, os países responsáveis pelo comércio internacional foram: Canadá (34,3%), União Europeia (23,3%), Rússia (18,3%), Bielorrússia (16,8%), Ucrânia (5,3%), Estados Unidos (1,3%) e Austrália (0,2%). Com relação à representatividade da exportação para estes países, cerca de um terço do centeio produzido no Canadá é vendido nos mercados de exportação. Para UE, a exportação representou 25,3% no período referido. Já para a Bielorrússia e para a Rússia, a exportação consumiu 17,2% e 16,8% do total produzido pelo país.

Do lado das importações, no período de 2008-2012, os principais importadores de centeio foram os Estados Unidos (38,6%), o Japão (22,2%) e a UE (20,4%) e juntos respondem por mais de 80,0% da quantidade total importada no período. O Japão, a partir dos anos 1980, gradualmente se tornou importante importador de centeio, no entanto, observa-se uma redução das importações do país a partir dos anos 2000.  Mais de 90% do consumo do país destinado à alimentação animal. Já os EUA importante exportador nas décadas de 1960 e de 1970, passaram a importar quantidades crescentes desde a década de 1990, sendo o primeiro país importador entre os anos de 2007 a 2010 e em 2012. A análise do comportamento de compra dos demais países importadores revela a volatilidade do mercado e sua intrínseca relação com aspectos de oferta interna dos principais países produtores.  Em algumas safras, principais produtores como UE e a Rússia figuram como importadores e alguns países importam irregularmente conferindo um comportamento flutuante às importações de ano para ano. Por exemplo, as importações da UE foram de 337,0 e 461,0 mil toneladas, nas safras 2001/2002 e 2002/2003, respectivamente, a de 2 mil toneladas na safra 2003/2004. Já a Rússia, importou 150,0 mil toneladas na safra de 2010/2011, mas não realizou nenhuma importação entre os anos 2007, 2008, 2009, 2011 e 2012. Ou o caso da Coréia do Sul, que importou 121 mil toneladas na safra 2001/2002 e menos de 10 mil toneladas anuais entre os anos de 2004 a 2012.

Em termos de representatividade da quantidade importada no consumo do país, em países como Israel, Coréia do Sul e Japão, as importações representam quase a totalidade do consumo no país. No caso dos EUA, na década de 2000, as importações representaram 41,17% do total consumido no país, sendo que o consumo humano e industrial representou 75,3% do consumo do país.


* União econômica e política de 27 Estados-membros localizados na Europa.
[4] Calculado com base nos dados de USDA (2012).
[5] Médias calculadas com base em USDA (2012).
[6] Médias calculadas pelos autores com base em FAO (2012), considerando o período de 2006-2010.
[7] Cálculo com base nos dados da USDA (2012). Na produção mundial, o acréscimo médio foi de 27,8 kg/ha/ano.
[8] Bloco denominado de Commonwealth of Independent States (CSI) formado por Armênia, Azerbaijão, Bielorrússia, Cazaquistão, Georgia, Kisgistão, Moldova, Rússia, Tajiquistão, Turquimenistão, Ucrânia e Uzbequistão.
[9] Valores calculados pelos autores com base nos dados da FAO (2012).
[10] Dados calculados pelos autores com base nos dados da FAO (2012) para o período de 2006-2010.

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