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Novos rumos para o seguro rural
no Brasil
Gilberto
R. Cunha
Embrapa Trigo, Caixa Postal 451,
CEP 99001-970 Passo Fundo, RS.
Securidade e zoneamento agrícola. Este foi o tema do I Simpósio
Internacional de Securidade e Zoneamento Agrícola do Mercosul, realizado
em Brasília, nas dependências do Itamaraty, nos dias 5 e 6
de março de 1998. Durante o evento, especialistas em ciências
atuariais e em agrometeorologia discutiram questões relativas ao
estado atual da securidade rural na América do Sul e as novas ferramentas
de zoneamento agrícola aplicadas à redução
de riscos climáticos na agricultura.
O mercado de seguros no Brasil movimentou, em 1997, uma arrecadação
total de prêmios da ordem de US$ 16,5 bilhões. E isto correspondeu
a 2,15% do PIB brasileiro, estimado, naquele ano, em US$ 770,0 bilhões.
Denotando um crescimento de mais de 100% na participação
no PIB, quando comparado ao período pré Plano Real (participava
com pouco mais de 1% do PIB, em 1993). Todavia, os números do seguro
rural continuam baixos. Em 1997, a arrecadação de prêmios
de seguros rurais foi de US$ 35,0 milhões, correspondendo a apenas
0,212% do mercado segurador. Mostrando claramente que o interesse privado
na área de seguros rurais continua baixo. Particularmente, considerando-se
a participação do complexo do agribusiness no PIB que, em
1997, foi da ordem de US$ 269,5 bilhões (35% do PIB).
Historicamente, o seguro rural no Brasil começou em São
Paulo. No final dos anos 30, a secretaria da agricultura deste estado produzia
e comercializava sementes selecionadas de algodão. No preço
de venda das sementes foi introduzido o prêmio de um seguro que indenizava
despesas de custo direto nas lavouras de algodão atingidas por granizo.
Alguns anos depois, esse seguro foi aplicado também na cultura de
uva. E, em 1967, ampliou-se para as áreas de olerícolas e
de fruteiras, amparando-as contra os riscos de geada. Também nesse
ano, as operações foram transferidas para a Companhia de
Seguros do Estado de São Paulo (COSESP). Hoje, a COSESP é
a principal companhia que está operando com seguro rural no país,
ampliando seus limites de atuação também para o estado
do Paraná. Na modalidade de seguro rural da COSESP, enquadram-se:
seguro agrícola (vinculado ao crédito e facultativo), seguro
floresta, penhor rural, porteira fechada e de animais.
Entre as iniciativas do Governo Federal, na área de securidade
rural, destaca-se a criação da Companhia Nacional de Seguro
Agrícola, em 1954. Essa, por sua vez, foi dissolvida em 1966, quando
da criação do Sistema Nacional de Seguros Privados. Na ocasião,
para garantia da atividade, foi instituído o Fundo de Estabilidade
do Seguro Rural (FESR), ficando sua administração a cargo
do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB). Os recursos principais do FESR
eram oriundos das comissões de corretagem dos seguros dos bens,
direitos, créditos e serviços do poder público, contratados
pelas seguradoras através de sorteio. Em 1995, com extinção
do regime de sorteio e do Plano Nacional de Privatizações,
o IRB informou, via circular ao mercado, que em função dos
reflexos na arrecadação de recursos do FESR a cobertura dos
seguros rurais estaria na dependência da concessão de crédito
especial da União. Também a proporção dos contratos
de resseguro tipo "cota-parte" foi invertida, passando de 20/80 para 80/20.
Com isso, houve uma retração ainda maior das companhias seguradoras
na área rural. A COSESP ficou praticamente sozinha no mercado de
seguros rurais, além da atuação isolada de algumas
empresas na emissão de apólices para pomares no Rio Grande
do Sul.
Paralelamente, o Governo Federal criou, em 1973, um importante instrumento
de política agrícola: o Programa de Garantia da Atividade
Agropecuária (PROAGRO). Seu objetivo era de garantir a atividade
dos produtores rurais, quando os custos investidos em seus empreendimentos,
creditícios ou próprios, são prejudicados por fenômenos
naturais adversos. Em sua primeira fase, o PROAGRO se configurou como um
pagador de seguros. Era administrado pelo Banco Central e cobria multiplicidade
de riscos. Se propunha a isentar o produtor de qualquer risco. Com abundância
de recursos públicos, funcionou normalmente até o
final dos anos 80. A partir de 1990, as coberturas deixaram de ser pagas
e o passivo acumulado, entre 1991 e 1995, passou dos R$ 700 milhões.
Altas taxas de sinistralidade, coberturas fraudulentas e metodologia atuarial
inadequada, associadas à falta de recursos públicos, inviabilizaram
a continuidade do programa nos seus moldes originais. Foi assim que a partir
da safra de 1996, com a cultura de trigo no sul do Brasil, nasceu um novo
PROAGRO, cuja base para a sua implementação foi o zoneamento
agrícola posto em prática pelo Ministério da Agricultura
e do Abastecimento. Novas regras (não cobrindo multiplicidade de
riscos) e a indução do uso de tecnologia (zoneamento de riscos
climáticos e plantio direto) nortearam o novo Programa de Garantia
da Atividade Agropecuária.
A partir do zoneamento agrícola, trabalhando-se com redução
de riscos e aumento de produtividade, o PROAGRO passou a atuar com uma
tabela atuarial diferenciada. Também buscou a recuperação
da imagem do programa, com a quitação dos débitos
pendentes. E passou a ser utilizado como instrumento de política
agrícola voltado ao cumprimento das metas do governo. A queda do
índice de sinistralidade e uma rentabilidade positiva desde a implementação
do zoneamento agrícola são os pontos fortes do programa.
Anteriormente, a cobertura anual andava na ordem de R$ 150 milhões,
tendo caído para menos de R$ 500 mil, em 1996.
A partir dos anos 90, com a diminuição dos recursos do
governo federal para o crédito rural, surgiu uma nova modalidade
de financiamento privado para a atividade rural. Os grandes operadores
do mercado – Trading Companies, esmagadores e processadores – supriram
a deficiência de crédito via os contratos de compra e venda
com pagamento à vista e entrega futura. Estima-se que anualmente
o total de pré-financiamento privado aos produtores rurais no Brasil
situe-se entre US$ 10 e 15 bilhões. No setor de grãos, os
contratos de "soja-verde" são um exemplo desse tipo de operação. Assim, visando proporcionar uma proteção de seguro para
as carteiras de pré-financiamento rural privado foi desenvolvido
o conceito de riscos agregados de natureza catastrófica. O objetivo
é de atender às operações das grandes empresas
do setor por meio de um seguro rural privado e comercial, sem subsídio
e ingerência do governo na sua operacionalização. A
diferença do seguro rural convencional reside no fato de tratar-se
de um seguro contratado pelo financiador (segurado) para proteger sua carteira
de fornecedores (tomadores). A indenização é sempre
paga ao segurado e não ao tomador. Para ser atrativo, a cobertura
deve ser a mais abrangente possível, cobrindo o maior número
de riscos. A dispersão de riscos é obtida pelo fato dessas
empresas trabalharem sobre uma base geográfica espalhada (até nove estados, em alguns casos).
Uma outra modalidade de seguro rural no Brasil são os fundos
mútuos para proteção de danos por granizo, praticados
em algumas cooperativas, por exemplo na Cooperativa Agrária Mista
Entre Rios Ltda, no Paraná.
No momento, a securidade rural é ainda muito tímida no
Brasil. Porém, a importância do agribusiness na composição
do PIB e o desempenho nos últimos anos – queda na taxa de sinistralidade
e rentabilidade positiva - vislumbram novas possibilidades e, talvez, aumente
o interesse do mercado. Quem sabe, um dia se chegue a trabalhar com produtos
de seguro que garantam não apenas o crédito, mas também
a receita do produtor. Para isso, a implementação do zoneamento
de riscos climáticos associado à indução de
uso de tecnologia é o primeiro passo.
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