Dezembro, 2006
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Passo Fundo, RS
Germinação

Conforme Meredith & Pomeranz (1985) deve-se distingüir entre germinação no campo, maltagem e germinação em laboratório. As condições físicas e as mudanças fisiológicas resultantes diferem nos três tipos de germinação e, segundo estes autores é perigoso transferir conclusões de um tipo de germinação para os outros tipos. Quando o grão começa a germinar na planta de trigo na época de colheita, denomina-se germinação no campo. As terminologias maltagem e germinação são usadas alternadamente na literatura, para descrever o processo de embebição ou maceração com água, de grãos de cereais secos até que eles estejam saturados, seguido pela germinação sob condições controladas por um período específico (Chavan & Kadan, 1989).

De modo genérico a maltagem é uma germinação controlada, seguida pela secagem controlada de uma semente (Hoseney, 1986), como a de trigo, por exemplo. Na maltagem, empenha-se em minimizar o crescimento da semente para evitar a perda de açúcares, causada pelo crescimento e respiração. Ao mesmo tempo é maximizada a degradação do endosperma e a formação de enzimas (Munck, 1981). Estas diferenciações ainda não são aceitas oficialmente e a maioria dos autores usam estes termos indistintamente (Hwang & Bushuk, 1973; Dronzek et al., 1974; Lukow et al., 1985; Sharma et al., 1988; LeelavathI et al., 1990; Sur et al., 1993).

Apesar da germinação ser um fenômeno amplo e complexo, pode ser definida como o processo pelo qual, sob condições apropriadas, o eixo embrionário da semente (como a de trigo), dá prosseguimento ao seu desenvolvimento, que tinha sido interrompido por ocasião da maturidade fisiológica (Carvalho & Nakagawa, 1988).

Para uma semente viável germinar, certas condições devem ser favoráveis: fornecimento adequado de água, temperatura desejável, certa composição de gases na atmosfera, luz (certas sementes) e ausência de inibidores da germinação, as duas primeiras condições são os fatores mais cruciais (Lorenz, 1980). Conforme Mayer & Poljakoff-Mayber (1989) a faixa ideal de temperatura para a germinação de trigo está compreendida entre 15 e 31oC. Porém, para White (1973) citado por Chavan & Kadan (1989) encontra-se entre 70-80oF (21-27oC), durante 3-4 dias.

A germinação é um processo que envolve tanto reações catabólicas, como a degradação de substâncias de reservas, quanto reações anabólicas na produção de novas células e organelas do embrião (Metivier, 1979). A semente madura e seca (como a de trigo), em estado de quiescência, caracteriza-se pelo baixíssimo nível de atividades metabólicas. Para que a semente abandone este estado e inicie sua germinação, ela passa por um "despertar". Este consiste fundamentalmente de eventos que podem ser sumarizados como: reidratação, em que ocorre a embebição de água pelas células do embrião e endosperma; formação e liberação de enzimas, com a reativação das organelas celulares e macromoléculas e metabolismo das substâncias de reserva, com geração de energia metabólica através do sistema citocromo, levando, ao crescimento e divisão da célula (Meredith & Pomeranz, 1985; Popinigis, 1985).

No processo de absorção de água, embebição máxima durante a maceração das sementes é vantajosa. Porém, água demasiada pode quebrar a casca e afetar a capacidade de germinação (Chavan & Kadan, 1989). O processo de embebição caracteriza-se pelo aumento do volume da semente (o volume de água absorvida é grande em relação ao peso da matéria seca da semente), desenvolvimento de considerável pressão, que é acompanhada pela liberação de calor durante o início da absorção de água (é um processo exotérmico) e o volume final é menor que a soma dos volumes originais da água e da semente. A embebição diminui com o aumento da concentração do soluto na água, devido a efeitos osmóticos. Isto é devido principalmente às proteínas que absorvem a água durante a germinação. A celulose também pode contribuir para o entumescimento, enquanto o amido não tem efeito. A embebição de água pelas sementes reflete em alguma extensão a composição da semente (Levary, 1960 citado por Lorenz, 1980; Popinigis, 1985).

Durante a germinação e o crescimento da semente (como a de trigo), o embrião produz e secreta giberelinas naturais para o endosperma. Estes hormônios induzem o desenvolvimento de enzimas hidrolíticas. A camada de aleurona é a sede da síntese de importantes enzimas que participam na degradação das reservas que se encontram no endosperma. Os primeiros dois dias de germinação coincidem com o máximo movimento de giberelinas do embrião para a aleurona, e por isso a manutenção da umidade é essencial (Meredith & Pomeranz, 1985).

O eixo embrionário da semente possui reservas suficientes para as atividades metabólicas das primeiras 24 horas de germinação. Estas reservas perfazem aproximadamente 20% de seu teor de matéria seca e são constituídas por sacarose, rafinose, lipídios e aminoácidos (Popinigis, 1985). À medida que a germinação progride, o peso total da matéria seca da plântula diminui, acusando perda correspondente à energia empregada nas transformações metabólicas e de transporte, somada às perdas de energia ocorridas durante o processo (Metivier, 1979).

O processo de germinação (como o do trigo), diminui o teor de amido da semente, devido sua transformação em glicídios, porém estes não acumulam, são utilizados em grande parte na respiração, para produção de energia, bem como na síntese de outras moléculas complexas (Popinigis, 1985). Os cereais apresentam quantidades relativamente pequenas de lipídios, basicamente triglicerídios (Drapron et al., 1969); que na germinação são hidrolisados e também não acumulam na semente, sendo utilizados para os processos metabólicos.

As proteínas, por sua vez, são armazenadas em partículas protéicas ou grãos de aleurona. Durante a germinação, ocorre a hidrólise catalisada por proteases. Os aminoácidos resultantes são translocados para os pontos de crescimento, onde são utilizados diretamente na formação de novas proteínas, ou são oxidados para liberação de energia no Ciclo de Krebs (Popinigis, 1985).

Métodos de germinação

Existem poucos estudos científicos com grãos de trigo germinados no campo (Beléia & Grossmann, 1990; Pieniz et al., 1996; Lima et al., 1998) devido sua complexidade. Alguns caracterizam o material de partida como porcentagem de grãos germinados, contudo os grãos germinados variam muito na quantidade de enzimas. Assim, o mais comum é a utilização de métodos de germinação caseiros e/ou de laboratório (Kruger, 1994).

Diferentes métodos tem sido usados para produzir cereais germinados por processo caseiro, mas basicamente as sementes secas são maceradas em água (1:3 p/v) até que estejam completamente saturadas e após, o excesso de água é drenado e as sementes colocadas em um recipiente ou amarradas em pano para que germinem (Chavan & Kadan, 1989).

Nos experimentos de laboratório tem sido usados condições ideais de germinação e períodos de maceração, germinação e secagem pré-determinados (tabela 1). Assim, pode-se escolher as condições desejadas, como realizar pré-tratamento ou não, macerar ou não os grãos, utilizar o processo de germinação entre papéis, em placas de Petri ou em bacias/bandejas; ou ainda realizar secagem em diferentes temperaturas.

Efeito da germinação na composição química e na qualidade nutricional

A germinação de grãos de cereais causa aumento na atividade enzimática, perda na matéria seca total, mudança na composição em aminoácidos, diminuição do amido, aumento de açúcares, leve aumento em lipídios, fibra bruta e em certas vitaminas e minerais (Morad & Rubenthaler, 1983). O aumento de nutrientes reflete a perda da matéria seca, principalmente sob a forma de carboidratos devido a respiração do grão (Lorenz, 1980). Embora as mudanças quantitativas sejam consideradas aparentes, qualitativamente são mais evidentes e com grande importância nutricional.

Marero et al. (1990) investigaram a quebra do amido em maltoligossacarídios através do processo de germinação. Os açúcares totais nas amostras de farinha diminuiram após o período de germinação de 4 dias (96 horas) devido a atividade da a-amilase. Os açúcares solúveis aumentaram nas farinhas, isto pode ser atribuído ao aumento da taxa de mobilização de carboidratos solúveis no endosperma dos cereais durante a germinação. Dronzek et al. (1974) observaram consideráveis aumentos nos açúcares livres durante a germinação de trigo e que, mesmo após 8 dias de germinação, nem todos os grânulos de amido foram atacados pelas amilases, havia ainda um grande número de grânulos intactos. Os grânulos de amido próximos a camada de aleurona do grão foram atacados em um estágio inicial e mais severamente que os grânulos no interior do endosperma, sugerindo uma maior atividade da a-amilase na camada de aleurona. A maioria dos ataques foram em grânulos tipo A (grandes), nos estágios iniciais da germinação, diferentemente dos grânulos tipo B (pequenos e esféricos), sugerindo que estes grânulos diferem na estrutura física. Segundo Lineback & Ponpipom (1977) as células da parede do endosperma pareciam ter sofrido hidrólise que não foram observadas durante os estágios posteriores de germinação, quando a degradação dos grânulos de amido no endosperma foram mais extensas.

Os teores de fibra alimentar em farinhas de trigo sem germinar foram estudados por Nyman et al. (1984) que investigaram os teores fibra alimentar em farinhas de trigo vermelho duro de inverno, com diferentes taxas de extração pelo método enzimático-gravimétrico de ASP, encontrando 12,1% de fibra alimentar total na farinha com 100% de extração, sendo o conteúdo de fibra solúvel cerca de 1,3%, independente do grau de extração, mostrando que os polissacarídios solúveis provém essencialmente do endosperma. Os principais componentes da fibra alimentar da farinha com 100% de extração foram: xilose (36%), glicose (33%) e arabinose (24%), contudo a composição foi similar nas diferentes taxas de extração, sugerindo que a razão xilose-arabinose no endosperma e nas camadas mais externas é similar. Porém, estas proporções variam nas diferentes variedades de trigo.

Em estudo interlaboratorial os teores de fibra alimentar em farinha integral de trigo determinados através de método enzimático-gravimétrico, variaram de 5,33 a 16,98%, sendo o valor médio das análises de 30 laboratórios, 12,92% (Prosky et al., 1984). Prosky et al. (1985) verificaram um teor de 12,57% de fibra alimentar total em farinha integral de trigo e Ranhotra (1994) encontrou 10,2%.

Não foram encontrados dados de literatura sobre os teores de fibra alimentar em farinhas de trigo germinado. Contudo, Ranhotra et al. (1977) encontraram um aumento na fibra bruta de 2,70% na farinha controle para 4,30%, macerando o trigo por 2 dias e deixando germinar por 4 dias a 23oC. Kumar & Chauham (1993) também relataram que o teor de fibra aumentou proporcionalmente ao período de germinação e que o desaparecimento do amido, o desenvolvimento de radículas e seu crescimento adicional, podem resultar em tecido fibroso aumentando assim o conteúdo de fibra dos brotos.

Danisová et al. (1994) sugeriram que os componentes das matérias-primas que contém fibra na sua composição (lignina, celulose) são construídos dos polissacarídios (principalmente amido), uma vez que o conteúdo de carboidratos solúveis diminuiu durante a germinação em pelo menos 1%. Entretanto, para Lorenz (1980) e Chavan & Kadan (1989) o aumento no conteúdo de fibra pode ser explicado com base na degradação da parede celular durante a germinação, não havendo nenhuma evidência de que os componentes da fibra como celulose e lignina sejam sintetizados dos carboidratos durante a germinação.

Proteínas

As diferenças na composição em aminoácidos do trigo e proteínas da farinha são afetadas pela taxa de extração da farinha, sistema de moagem e também em menor proporção pelas propriedades de moagem de trigos de várias classes e variedades (Shoup et al., 1966). Entre os fatores que podem contribuir para as variações no conteúdo de proteína de farinhas de cereais germinados estão: espécies e cultivares, temperaturas de germinação, método de germinação, tempo de maceração e porcentagem de germinação (Chavan & Kadan, 1989).

Beresh (1969) citado por Hwang & Bushuk (1973) mostrou que a degradação das proteínas do glúten durante a germinação ocorre primariamente como resultado da quebra das ligações peptídicas. Subseqüentemente, isto poderia levar a uma quebra de ligações secundárias (iônicas, de hidrogênio e hidrofóbicas), conhecidas por contribuirem para a estrutura física do glúten. Na maioria dos estudos a proteína total aumentou durante a germinação de cereais. Isto tem sido atribuído a perda de matéria seca através da respiração durante a germinação ou a uma alteração das substâncias nitrogenadas, ao invés de aumento real de proteínas (Lorenz, 1980).

Dalby & Tsai (1976) estudaram a mudança no teor de proteínas de vários cereais germinados por 5 dias a 28oC no escuro, encontrando um aumento no conteúdo de proteína, proporcional ao tempo de germinação. Resultados semelhantes foram obtidos por Ranhotra et al. (1977) que verificaram o aumento no teor de proteína em farinha de trigo germinado, obtida pela maceração do trigo em água destilada por 2 horas, germinação por 3 a 5 dias a 23oC no escuro, liofilização e moagem.

Nielsen et al. (1978) citados por Chavan & Kadan (1989) encontraram teores aumentados de proteína com o aumento do tempo de germinação, teores de 12,9% de proteína (N x 5,7) em trigo sem germinar aumentaram para 13,5; 13,3 e 14,7% em trigo germinado à 20 oC por 48, 96 e 240h, respectivamente. Lemar & Swanson (1976) obtiveram concentrações de proteína e cinzas aumentadas em relação a farinha controle em farinhas integrais de trigo vermelho duro de inverno, germinado por 1 e 3 dias.

Em farinhas brancas de trigo mole germinado por 48 e 96 horas, Lorenz & Valvano (1981) obtiveram teores de cinzas e proteína aumentados em relação a farinha sem germinar e Leelavathi et al. (1990) encontraram aumentos significativos nos teores de proteína e cinzas em farinhas brancas de trigo macerado por 16 horas e após germinado por 24, 48 e 72 horas. Hwang & Bushuk (1973), no entanto, encontraram uma pequena perda de proteína, em farinha de trigo macerada por 2 dias e então germinada por 2, 4 e 8 dias a 20oC. A diminuição no teor de proteínas foi atribuído a perda de compostos nitrogenados de baixo peso molecular, por aumento da atividade proteolítica devido ao longo período de maceração dos grãos. Assim o tempo de maceração explicaria as diferenças no conteúdo protéico como resultado da germinação. Observaram também que durante a germinação na hidrólise das prolaminas, aminoácidos como a prolina e o ácido glutâmico são convertidos em lisina.

Sharma et al. (1988) também encontraram diminuições significativas nos conteúdos de proteína e cinzas de farinhas brancas produzidas de trigo germinado por 24 e 48 horas a 30oC. Contudo, os teores de proteína, cinzas e lipídios dos grãos de trigo germinados dos quais foram produzidas estas farinhas pouco se alteraram. A diminuição de proteína foi atribuída ao processo de moagem de grãos germinados que levou a menores recuperações, quando comparados com a amostra controle e/ou a perda de compostos de nitrogênio de baixo peso molecular (ou seja, a solubilização de proteínas durante a maceração), já os menores teores de cinzas podem ter sido consequência de perdas na lavagem no processo de maceração e ao uso dos ions inorgânicos durante a respiração.

Danisová et al. (1994) embora não tenham verificado aumento significativo no teor total de proteína durante a germinação do trigo por 48 e 96 horas, observaram aumentos nos conteúdos de aminoácidos essenciais (5-23%) e totais (para alguns aminoácidos acima de 50-100%), comprovando, que no processo de germinação a degradação de proteína ocorre, tornando o alimento mais facilmente digerível. Segundo Mayer & Poljakoff-Mayber (1989), as sementes secas (como as de trigo),possuem poucos aminoácidos livres. O crescimento do embrião na semente em germinação, depende de um fornecimento de aminoácidos para a síntese protéica e a principal fonte para esta síntese são as proteínas de armazenagem, mas sua relação de aminoácidos não é necessariamente igual a proteína recentemente sintetizada e, aparentemente ocorre interconversão de aminoácidos. Os principais caminhos para esta interconversão são as reações de transaminação e desaminação.

Durante a germinação no escuro, as proteínas são hidrolisadas em aminoácidos, parte destes aminoácidos são desaminados oxidativamente e o esqueleto carbono entra em vários ciclos respiratórios e carbônicos. A amônia formada pela desaminação é detoxicada pelo processo de formação de amida. As principais amidas formadas são a glutamina e asparagina, dependendo da planta. Porém, nem todos os aminoácidos são desaminados, parte é utilizada para a síntese de proteínas na região de crescimento da semente (Mayer & Poljakoff-Mayber, 1989).

As mudanças no conteúdo de aminoácidos durante a germinação de cereais têm sido muito estudadas. Chavan & Kadan (1989) afirmaram que a maioria dos aminoácidos essenciais diminuem com a germinação, exceto a lisina, que aumenta notavelmente. Tsai et al. (1975) observaram um grande e rápido aumento dos aminoácidos limitantes em cereais, lisina e triptofano, durante os 4 primeiros dias de germinação de milho normal e o teor destes aminoácidos foi comparável aos valores encontrados em milhos com alto teor de lisina.

Sementes de sorgo e milho germinadas a 25, 30 e 35oC apresentaram níveis aumentados de lisina, metionina e triptofano quando comparadas com sementes não germinadas (Wang & Fields, 1978). Tkachuk (1979) determinou os níveis de aminoácidos livres em sementes de trigo germinado por 2, 4, 12, 24, 48, 72, 100 e 122 horas, encontrando que a germinação prolongada causa grandes aumentos nos níveis de todos aminoácidos livres, com exceção do triptofano e ácido aspártico. Explicou que este aumento nos aminoácidos livres se deve ao acréscimo nos níveis de enzimas proteolíticas durante a germinação. Os maiores aumentos foram exibidos pela prolina e glutamina.

Miller (1978) citado por Chavan & Kadan (1989) relataram um aumento no conteúdo de lisina de 15 a 27% após 7 dias de germinação com aumento maior em trigos com baixos teores protéicos e menor em variedades de altos teores protéicos. Tais variações nos resultados podem ser atribuídos as variações nos procedimentos usados para germinação, porcentagem de germinação e vigor das sementes. A variação no conteúdo protéico devido a fatores agronômicos ou causa genética pode também ser importante na extensão do aumento de lisina nos grãos durante a germinação.

A extensão do aumento de lisina parece estar diretamente relacionado com a quantidade de prolaminas presente e sua taxa de mobilização (Chavan & Kadan, 1989). Dalby & Tsai (1976) notaram que, durante a germinação de trigo por 5 dias, o teor de lisina aumentou e de prolamina diminuiu, sugerindo uma aparente correlação entre o conteúdo de prolamina, sua taxa de mobilização e a extensão de aumento de lisina.

Miladi et al. (1972) encontraram para o trigo, 2,47 g/100g de lisina e 2,82 g/100g de treonina e teor de amônia de 3,73 g/100g, e WU et al. (1984) obtiveram para trigo branco mole de inverno, 3,2 g/100g de lisina e 3,3 g/100g de treonina. Entretanto, Danisová et al. (1994) obtiveram teores mais elevados, para o trigo foi encontrado 3,42g/100g de lisina e 3,02g/100g de treonina e para o trigo germinado, 4,06 e 3,59 g/100g, respectivamente. Os resultados obtidos por Marero et al. (1988ab) mostraram que a combinação de farinhas de cereais e leguminosas na proporção 70:30 fornecia eficiente complementação de aminoácidos, próximos aos valores de referência da FAO, exceto para os aminoácidos sulfurados, treonina, lisina e triptofano.

A análise química dos aminoácidos livres nos hidrolisados ácidos de um alimento pode fornecer uma boa estimativa da quantidade total de cada aminoácido que ele contém. Contudo, as quantidades que podem realmente ser de valor nutricional são menores, devido a uma fraca digestibilidade da proteína, e também, possivelmente, porque os aminoácidos individuais estão presentes em ligações químicas (isto é., na forma ligada) que são liberadas por digestão à quente em presença de ácido forte, mas não pelas enzimas digestivas no intestino. O segundo tipo de problema ocorre particularmente com unidades de lisina que ainda tem grupo amino primário reativo quando ligado a uma cadeia peptídica. Durante o processamento de alimentos, este grupo pode sofrer reações de Maillard com açúcares redutores ou outros compostos aldeídicos e, sob condições mais severas, formar imidas com compostos que tenham grupos carboxila livres. Isto pode ser de importância nutricional uma vez que a lisina é o primeiro aminoácido limitante nos cereais (Carpenter et al., 1989).

Quando o teor de lisina da dieta é insuficiente, limita o crescimento de animais. Em muitos alimentos, a lisina é o aminoácido limitante não somente pelas pequenas quantidades que são incorporados das proteínas durante a biossíntese, mas também em conseqüência de mudanças químicas secundárias devido a fatores como luz, calor, álcali e açúcares redutores tornando a lisina nutricionalmente indisponível. A lisina é nutricionalmente disponível quando o grupo ε-amino está livre. Se este grupo estiver bloqueado através de uma ligação química, o segmento da proteína próximo ao resíduo de lisina afetado pode não ser digerido (Holguin & Nakai, 1980).

Miladi et al. (1972) obtiveram para o trigo o escore químico de 35 e 91% de disponibilidade de lisina (2,47 g/100g de lisina e 2,25 g/100g de lisina disponível), próximo da faixa de 89 a 94% encontrada por Taverner & Farrell (1981a) para grãos de trigo de variedades diferentes. Já Taverner & Farrell (1981b) encontraram valores médios de 86% de lisina disponível no trigo.

As mudanças que ocorrem durante a germinação são causadas por várias enzimas presentes na semente seca e tornam-se ativas no momento da embebição de água. As enzimas hidrolíticas predominam durante os primeiros estágios do processo de germinação. Estas incluem, enzimas que degradam carboidratos, como a e b-amilases, endo-b-gluconase, dextrinase limite, proteases e lipases. Entre as enzimas que hidrolisam carboidratos, a a-amilase é a principal enzima que hidrolisa amido (Chavan & Kadan, 1989). Corder & Henry (1989) avaliaram enzimas que degradam carboidratos durante a germinação de trigo, notando que a atividade enzimática (a-amilase, b-glucanase e b-xilanase) aumentou após 4 dias de germinação. Porém, a atividade diminuiu quando os grãos foram secos a 30oC. Temperaturas mais altas podem inicialmente acelerar a produção de algumas enzimas até que a umidade ou temperatura tornem-se limitantes, reduzindo assim a aparente perda de atividade.

No estudo da atividade lipolítica no decorrer da germinação observou-se que a atividade lipolítica ocorre no coleóptilo; durante a germinação no escuro, a degradação de lipídios pela lipase fornece uma importante fonte de energia, compensando assim em parte a falta de energia radiante; a 30oC a atividade lipolítica dos grãos germinados no escuro foi bem maior do que a 15oC (Drapron et al, 1969).

O método de germinação pode ser uma maneira de converter proteínas vegetais de fraca qualidade nutricional em proteínas de melhor qualidade, para uso humano e animal. No entanto, segundo Lorenz (1980), os resultados neste sentido não têm sido encorajadores. A maioria dos estudos em animais não mostraram diferenças significativas de ganho de peso, quando se comparou animais (gado, porcos e frangos) alimentados com cereais germinados e os que usaram cereais não germinados na alimentação. Enquanto experimentos com outros animais não mostraram tais melhoras e dados com humanos não são disponíveis, a maioria dos experimentos "in vitro" com Tetrahymena e com ratos, indicaram melhoras nutricionais através da germinação (Chavan & Kadan, 1989).

A qualidade protéica dos alimentos depende não somente de sua composição em aminoácidos mas também da disponibilidade destes aminoácidos. A lisina é o aminoácido limitante do trigo. O valor nutritivo relativo (RNV), medido por Tetrahymena pyriformis e o conteúdo de lisina disponível, medida por hidrólise com Pediococcus cerevisae, para farinha integral de trigo feita de trigo germinado à 20oC por 3 dias, foram significativamente mais altos do que para farinha de trigo não germinado, indicando assim, uma melhora na qualidade protéica (Hamad & Fields, 1979).

Quanto mais longo o período de germinação de cereais e leguminosas, maior a digestibilidade de suas farinhas. Desta maneira, o aumento da digestibilidade protéica “in vitro” foi causado pela redução efetiva de fatores antinutricionais através da germinação, em adição aos tratamentos de calor durante a preparação de farinhas e elaboração dos alimentos (Abbey & Mark-Balm, 1988; Marero et al., 1991a).

Lipídios e estabilidade ao armazenamento

Wu & Wall (1980) não observaram mudanças no conteúdo de lipídios durante a germinação de grãos de sorgo. Contudo, Lemar & Swanson (1976) e Ranhotra et al. (1977) encontraram maiores teores de lipídios em FITG por 3 e 5 dias, respectivamente, o que atribuiram ser conseqüência da síntese de lipídios é oriunda da degradação do amido.

Diferenças no tempo de maceração e condições de germinação podem causar mudanças no produto armazenado. Entretanto, em todos os estudos com trigo, o conteúdo final de lipídios de grãos germinados foi superior ao de grãos não germinados. O aumento no conteúdo de lipídios tem sido atribuído a síntese destes originada da degradação do amido (Lorenz, 1980).

O grão saudável, armazenado adequadamente conserva-se como uma fonte alimentar por meses ou mesmo anos. O trigo germinado e armazenado em condições inadequadas pode induzir a mudanças que levam a problemas de rancidez nas matérias-primas ou em produtos feitos delas (Galliard, 1983).

As mudanças deteriorativas nos grãos podem ser oxidativas, resultando em odores e sabores de rancidez típicos, ou hidrolíticas, resultando na produção de ácidos graxos livres. Os grãos contém antioxidantes ativos que protegem contra os efeitos do oxigênio, assim a rancidez oxidativa raramente é um problema em grãos armazenados. Porém, a farinha de trigo integral pode ser mantida por um período relativamente curto, porque rapidamente rancifica devido sua maior quantidade de lipídios (Pomeranz, 1974).

A rancidez pode ser conceituada como uma avaliação organoléptica subjetiva da qualidade do alimento. Os “off-flavours” relacionam-se às mudanças que resultam da reação com o oxigênio atmosférico, isto é, rancidez oxidativa, ou pelas reações hidrolíticas catalisadas pelas lipases do alimento ou dos microrganismos. Os efeitos das reações hidrolíticas podem ser minimizados pelo processamento e armazenamento adequados, já a rancidez oxidativa ou autoxidação, é uma reação química com baixa energia de ativação (4-5 kcal.mole-1 para o primeiro passo e 6-14 kcal.mole-1 para o segundo passo), em que a velocidade da reação não é significativamente diminuída pelas condições de processamento e armazenamento (Hamilton, 1983).

Sur et al. (1993) verificaram que o teor de lipídios de farinhas controle e de trigo germinado por 24 e 48 horas não apresentou diminuição significativa com o armazenamento por 0, 45, 90 e 135 dias. Contudo, os ácidos graxos livres em farinhas germinadas estocadas aumentaram significativamente após 135 dias de armazenamento e o aumento foi mais pronunciado do que nas farinhas não germinadas, mostrando que as primeiras deterioram mais rapidamente durante um longo período de estocagem. Foi sugerido que o aumento na acidez pode ser devido a quebra enzimática dos lipídios.

Molteberg et al. (1995) notaram que a acidez titulável aumentou significativamente com o aumento da umidade relativa e o tempo de armazenamento de aveia branca processada. Usaram o hexanal, o principal produto volátil da oxidação lipídica com a maior alteração durante o armazenamento e processamento, como um indicador do conteúdo total de produtos de oxidação. A concentração de hexanal nas amostras de aveia aumentou durante o armazenamento, paralelamente ao aumento nos níveis de ácidos graxos livres.

Fritsch & Gale (1977) na determinação de hexanal em produtos cereais com trigo (cereais matinais) encontraram no tempo zero, 0,03 ppm e após 20 e 32 semanas, 0,72 e 3,97 ppm de hexanal, respectivamente. Concluiram que a velocidade de oxidação lipídica de produtos desidratados é afetada não somente por sua composição mas também pelo teor de umidade, condições de processamento, área de superfície e outros fatores desconhecidos. Observaram que outros picos apareceram no cromatograma e aumentaram proporcionalmente a deterioração.

Cinzas e minerais

O aumento do teor de cinzas durante a germinação (de sementes, como as de trigo), é considerado aparente, devido à diminuição do conteúdo total de amido, já um decréscimo pode ser atribuído a perdas durante a maceração e lavagens. As mudanças quantitativas em um elemento mineral individual e sua forma química durante a germinação, podem ser mais importantes que as mudanças no teor de cinzas total. Um aumento em todos os elementos minerais é, claramente devido a perda de peso seco e, portanto, pode ser tratado como aparente (Chavan & Kadan, 1989).

Ahmad et al. (1994) no estudo da concentração de elementos traços em grãos de trigo encontraram 0,36 % de potássio; 38,9 ppm de ferro, 2,6 ppm de cobre e 24,2 ppm de zinco (ou 360; 3,89; 0,26; 2,42 mg/100g, respectivamente). Van Dokkum et al. (1982) mostraram que, com exceção do cálcio, o balanço mineral, o qual reflete a disponibilidade, é significativamente maior na farinha integral do que na farinha de trigo.

Danisová et al. (1994) encontraram decréscimo de ferro (30-60%) e de cálcio (8-12%) e um acréscimo de fósforo (9-16%) em trigo germinado por 48 e 96 horas. Ranhotra et al. (1977) na avaliação de minerais em trigo germinado, encontraram aumentos nos teores de cinzas totais, cálcio e zinco; já os teores de ferro e magnésio diminuiram até o terceiro dia, voltando a aumentar a partir do quarto dia de germinação.

A germinação de feijão cowpea levou a aumentos significativos nos teores de fósforo (20%); zinco (4,5%) e magnésio (3,5%). Uma diminuição foi observada para o cálcio (5,1%) e ferro (3,5%), porém, estas reduções não foram estatisticamente significativas. O aumento de fósforo devido a germinação pode ser explicado pelo aumento de atividade da enzima fitase, que hidrolisa o fosfofitato liberando o fósforo. As diminuições observadas no cálcio e ferro, bem como no potássio, podem ser devido a utilização para o crescimento do broto ou perdas na água durante a maceração. A redução no fitato pode aumentar a biodisponibilidade de cobre, magnésio, ferro, manganês e zinco, que formam complexos com fitato (Akinlosotu & Akinyele, 1991).

Vitaminas

O trigo germinado é rico em vitaminas do complexo B e também contém alguma pró-vitamina A e vitaminas D e E (Pomeranz & Robbins, 1971 citados por Chavan & Kadan, 1989). A farinha de trigo não contém quantidades detectáveis de ácido ascórbico, enquanto o trigo germinado possui pequenas quantidades desta vitamina (Lorenz, 1980).

Foram verificados que os aumentos significativos nos teores de vitamina C (834%), provocados pela germinação, ocorreram devido à produção desta vitamina para o crescimento dos brotos. Notou-se também um aumento no teor de niacina (237%) após 96 h de germinação (Akinlosotu & Akinyele, 1991). Contudo, Lemar & Swanson (1976) não encontraram ácido ascórbico na farinha de trigo germinado, verificando somente aumentos significativos nos teores de tiamina e riboflavina em relação ao controle. Concluiram que o aumento na concentração de vitaminas devido a germinação é de importância nutricional para pessoas que preferem intensificar os nutrientes para o enriquecimento do alimento.

Marero et al. (1991a) verificaram que a germinação diminuiu o conteúdo de tocoferóis de cereais, especialmente o de δ-tocoferol. Sugerem que os tocoferóis podem ter sido concentrados na área do germe e utilizados durante a germinação.

As variações nos teores de vitaminas dependem do tipo de cereal, cultivar, qualidade da semente e condições de maceração e germinação. A maioria dos trabalhos, concordam que a germinação geralmente melhora o valor vitamínico. Porém, o aumento quantitativo em cada vitamina pode ser pequeno e o significado prático, em se encontrar os requerimentos nutricionais para as dietas com base em cereais é difícil de ser avaliado, em ensaios de alimentação (Chavan & Kadan, 1989).

Outros constituintes

O fitato está presente em todos os cereais, contém de 50-85% do conteúdo total de fósforo e afeta negativamente a biodisponibilidade de muitos elementos essenciais, tais como cálcio, ferro e zinco. O fósforo fitato não está disponível para absorção humana a menos que os grupos fosfato tenham sido removidos da molécula de inositol (Ravindran et al., 1994 citados por Fredlund et al., 1997). A fitase está inativa no cereal seco, mas é ativada quando a umidade aumenta, sua atividade ótima é a 55oC e pH 5,1 (Bartnik & Szafranska, 1987). Assim, processos como maceração e germinação freqüentemente levam a degradação do fitato e aumento na disponibilidade de minerais (Sandberg, 1991 citado por Fredlund et al., 1997).

Visto que o ácido fítico está concentrado no germe e camada de aleurona ou no pericarpo das células dos grãos de cereais, este antinutriente é, portanto, destruído durante a germinação, porque o germe está envolvido fisiológicamente no crescimento da planta. Marero et al. (1991a) observaram que na preparação da farinha, o conteúdo de ácido fítico diminuiu significativamente devido ao processamento e, o cozimento, para preparação de mingau elaborado com cereais germinados por 96 horas, eliminou totalmente o ácido fítico. As mudanças nas atividades da fitase e o conteúdo de fitato em cereais foram determinados durante a germinação por Bartnik & Szafranska (1987). O teor de fosfofitato em trigo foi de 2,84-3,45 mg/g. Este valor diminuiu após 72 horas de germinação para 2,32-2,61 mg/g. A atividade da fitase no trigo aumentou aproximadamente 4,5 vezes, após 4 dias de germinação.

Fredlund et al. (1997) verificaram redução de 46% do fitato (inositol hexafosfato) em grãos integrais de trigo após incubação em água (pH 6-7) a 55oC por 24 horas e quando tampão acetato (pH 4,8) foi usado ocorreu a redução de 91% e Mellanby (1950) citado por Fredlund et al. (1997) encontraram que o fitato em grãos integrais de trigo foi reduzido em 84% após maceração em tampão acetato, pH 4,5 a 45 oC por 12 horas. Em trigo moído incubado nas mesmas condições o fitato foi completamente degradado dentro de 1 hora.

Zhou & Erdman (1995) estudaram os efeitos do ácido fítico na saúde, verificando que este tem alguns efeitos protetores, como diminuição do risco de câncer de cólon e redução do colesterol do soro e dos triglicerídios, em ensaios com animais. Além de ser considerado um antioxidante natural e ter funções potenciais na redução da peroxidação lipídica e como preservativo em alimentos.

Os polifenóis e taninos são conhecidos por inibirem várias enzimas hidrolíticas, como a tripsina, quimiotripsina, amilases, celulase e b-galactosidase. Em adição, eles se ligam com proteínas formando complexos proteína-tanino, tornando a proteína indisponível. (Salunkhe et al., 1982 citados por Chavan & Kadan, 1989). Os cereais contém quantidades muito pequenas de taninos, mesmo assim, a atividade antitríptica de arroz e milho diminuiu significativamente (p<0,05) durante a germinação por 96 horas. Nenhuma atividade foi encontrada nas amostras de farinhas de arroz e somente traços na farinha de milho. A mais alta atividade antitríptica foi encontrada em leguminosas sem germinar, porém, esta atividade diminuiu significativamente após 96 horas de germinação. O cozimento destruiu a atividade de inibidores de tripsina das farinhas (Marero et al., 1991b).

Respostas positivas de atividade fitohemaglutinina foram encontradas em amostras de arroz, milho e leguminosas sem germinar em uma titulação de 100.000 g de amostra/ml. Amostra germinadas por 24 horas mostraram resultados negativos, exceto o milho. Em todos os estágios posteriores de germinação (48, 72 e 96 h) nenhuma atividade de hemaglutinação foi observada (Marero et al., 1991b).

Com base nas mudanças na composição centesimal, aumentos nos teores de certos aminoácidos essenciais e vitaminas do grupo B, degradação parcial de proteínas e amido, diminuição de fatores antinutricionais, melhora da PER (taxa de eficiência protéica) e RNV (valor nutritivo relativo), bem como melhora no valor biológico e utilização de nitrogênio em ratos, pode ser razoavelmente aceito que o valor nutritivo de cereais seja melhorado pela germinação (Chavan & Kadan, 1989).

Efeito da germinação na qualidade tecnológica

O processo de germinação resulta em muitas mudanças fisiológicas, sendo que duas destas mudanças são tecnologicamente muito importantes do ponto de vista do processamento de alimentos. Uma delas é a formação de enzimas, através da síntese de novo ou reativação de enzimas pré-existentes em estado latente, que causa excessiva degradação dos componentes bioquímicos necessários para produzir um produto final satisfatório, como pão e manifesta seus efeitos diretamente durante o processamento. A segunda mudança é a degradação das reservas de armazenagem da planta “in situ” e significa que componentes bioquimicamente importantes foram danificados antes do processamento iniciar, por exemplo, se as proteínas do glúten foram danificadas, é comum que ocorra uma deterioração na qualidade do pão (Kruger, 1994).

A maioria dos estudos em relação ao trigo cita a preocupação com a germinação pré-colheita e os efeitos deletérios na farinha usada para panificação. A germinação no campo tem como principal conseqüência a perda quantitativa de rendimento e a deterioração da qualidade da farinha (Lukow & Bushuk, 1984; Sharma et al., 1988). A diminuição no rendimento de farinha total quase sempre ocorre. Leelavathi et al. (1990) verificaram uma queda de 68,3 para 62,8 devido a germinação por 72 horas e Lukow & Bushuk (1984) e Hwang & Bushuk (1973) obtiveram resultados semelhantes. Singh et al. (1987) relataram um aumento de aproximadamente 2% no rendimento de farinha na germinação por 48 horas e Sharma et al. (1988) concluiram que a germinação por 48 horas não afetou o rendimento.

Beléia & Grossmann (1990) no estudo da germinação pré-colheita de trigo observaram um progressivo aumento da produção de farinha de quebra com o aumento do nível de germinação, devido à hidrólise do endosperma tornar o grão mais friável, permitindo que mais farinha seja produzida pela ação dos rolos de quebra. Quando a germinação foi superior a 20%, as massas tornaram-se pegajosas e difíceis de manusear, resultando em pães com miolo úmido, células do miolo muito abertas e crosta excessivamente escura, o que pode ser atribuído à excessiva degradação do amido, com liberação de açúcares e dextrinas. Conforme Singh et al. (1987), a alta produção de gás, a partir dos açúcares fermentáveis, aliada à fragilidade do glúten, seria a responsável pelas células abertas.

A cor do miolo de pães tornou-se mais escura e a textura granulosa com níveis mais altos de germinação. O miolo de pães feitos com farinhas de trigo extensivamente germinado foi descrito como pegajoso e gomoso devido a uma excessiva quebra de amido (Ibrahim & d'Appolonia, 1979 citados por Lorenz, 1980).

Farinhas de trigo de grãos germinados, tem mostrado efeitos prejudiciais na massa, nas propriedades do pão e pastas alimentícias. Estes problemas são atribuídos ao excesso de atividade de a-amilase formada durante a germinação (Lorenz, 1980). Houve uma diminuição na qualidade de pães feitos com 100% de farinha de trigo germinado, o volume e a qualidade global do pão diminuiram proporcionalmente com o aumento do período de germinação. A adição de 5% de farinha germinada, no entanto, melhorou o volume do pão sem afetar outras características (Ranhotra et al., 1977).

Sharma et al. (1988) germinaram trigo em laboratório por 24 e 48 horas, produzindo misturas com farinha de trigo comercial em várias proporções. A mistura com 10-30% de grãos germinados produziu substancial melhora no volume de pães e bolos, porém, biscoitos não foram afetados pela mistura.

Bartnik & Szafranska (1987) sugeriram a possibilidade de utilização de grãos de cereais germinados como uma fonte potencial de fitase para aumentar a hidrólise de fitato durante a panificação, especialmente de pães preparados com materiais ricos em fitato, como farinha com alta taxa de extração, farelo, germe, farinha de soja, concentrados de soja e trigo, etc. Porém, concluiram que embora a atividade da fitase aumente extensivamente durante a germinação dos grãos, esta atividade não causa uma correspondente hidrólise do fitato porque durante a fermentação da massa (pH 6,7/ 30oC), nem o pH, nem a temperatura são ótimas para a atividade da fitase (pH 5,1/ 55oC).

A capacidade de absorção de água dá uma indicação da quantidade de água disponível para a gelatinização. Uma menor capacidade de absorção é desejável para tornar o produto mais fino quando disperso em água (Kulkarni et al., 1991). Leelavathi et al. (1990) observaram pelas características farinográficas de farinhas brancas de trigo que ocorreu uma redução na capacidade de absorção de água de 62,3 para 55,0% durante a germinação por 72 horas.

Lorenz & Kulp (1981) propuseram a modificação de amidos de milho, cevada e triticale pela germinação dos grãos antes do isolamento do amido. A extensão da modificação dependeu do tempo de germinação. A capacidade de ligar água dos amidos diminuiu inicialmente e então aumentou novamente com tempos de germinação mais longos. O poder de entumescimento diminuiu, enquanto a solubilidade e a suscetibilidade enzimática dos amidos aumentaram com a germinação. Estes amidos gelatinizaram numa temperatura mais baixa e numa faixa mais estreita do que os amidos de cereais não germinados. Valores de “Falling Number” (FN) e viscosidade amilográfica diminuiram devido a germinação dos grãos antes do isolamento do amido.

Leelavathi & Haridas-Rao (1988) obtiveram valores de FN de 422 para farinha integral de trigo e 62 para FITG e Leelavathi et al. (1990) observaram que os valores de FN diminuiram suavemente na maceração do trigo por 16 horas, de 492 para 301 e a germinação por 24 horas diminuiu o valor para o mínimo de 62. Lorenz & Valvano (1981), Lukow & Bushuk (1984) e Shashikumar et al. (1993) também chegaram as mesmas constatações.

As farinhas de cereais germinados apresentam baixa viscosidade, porque, os carboidratos complexos são hidrolisados em açúcares mais simples durante a germinação. Os açúcares são facilmente disponíveis para a absorção e a quantidade de energia e densidade total de nutrientes obtida por unidade de volume de alimento aumenta. Isto pode ser benéfico para pessoas com limitada capacidade digestiva e que não podem comer muito para ter suas necessidades de nutrientes (Asiedu et al., 1993).

Em países em desenvolvimento, os alimentos infantis são geralmente muito espessos e portanto, freqüentemente diluídos com água antes de serem dados às crianças, a conseqüente baixa densidade energética de tais alimentos levam a reduzida ingestão de calorias e proteína e é uma importante causa do baixo crescimento na infância (dos 6 meses aos 2 anos de idade) (Latta & Eskin, 1980).

A viscosidade das farinhas germinadas pode ser reduzida a qualquer nível desejado dependendo da extensão da germinação, tornando o processo especialmente adequado para elaboração de alimentos para crianças que estão passando de uma dieta líquida (leite materno) à uma dieta semi-sólida branda (Desikachar, 1980; Moussa et al., 1992). A viscosidade dos alimentos infantis dentro da faixa de 1000 e 3000 cps (centipoises), na qual o mingau varia de um estado líquido a semi-sólido, isto é, “free-flowing”, é considerada ideal para alimentação de crianças após o desmame (Mosha & Svanberg, 1983 citados por Marero et al, 1988b).

Gopaldas et al. (1988) estudaram a produção de um alimento rico em amilase à base de trigo, observando que o processo é simples e barato podendo ser facilmente transferido do laboratório para nível caseiro em regiões pobres. Contudo, a tostagem (80±4oC) dos grãos germinados foi necessária e a farinha rica em amilase tostada teve capacidade amilolítica mais do que suficiente para reduzir a densidade dos mingaus tradicionais.

Outros autores também produziram farinhas ricas em amilase a partir de grãos germinados para adição em alimentos infantis com redução da viscosidade: John & Gopaldas (1988) e Wahed et al. (1994) à base de trigo; Pedersen et al. (1989) à base de cevada; Gopaldas et al. (1988) à base de arroz e Malleshi et al. (1989) e Kulkarni et al. (1991) à base de sorgo e “cowpea”.

A germinação torna o grão mais friável e o tamanho de partícula da farinha diminui. Conforme Kulkarni et al. (1991) o tamanho de partícula é um aspecto importante de qualquer mistura granular que requer reconstituição com água. Nos tamanhos de partículas menores, a área mais superficial está disponível para a absorção de água. Um pó mais fino tende a formar mais grumos e tomar mais tempo e energia para fazer uma boa dispersão. As partículas muito grandes tornam a dispersão mais grosseira. Uma ótima distribuição do tamanho de partícula é essencial para que se obtenha a melhor aceitabilidade. Assim, os alimentos infantis comerciais produzidos com tamanhos de partícula maiores que 250μ produziram menos grumos do que tamanhos menores quando misturados em água.

Além disso, segundo Larsson & Sandberg (1995) o “flavour” desenvolvido pelos procedimentos de maceração de cereais é também importante na produção de alimentos mais atraentes: um gosto mais aceitável pode ser desenvolvido.

Farinha integral de trigo germinado

A farinha integral é o produto resultante da moagem do cereal limpo, com extração máxima de 95% e teor máximo de cinzas de 1,75% (BRASIL, 1978).

Finney & Rubenthaler (1979) empregaram farinha integral de trigo maltado como suplemento na produção de pães. O aumento do tempo de germinação diminuiu o tempo de fermentação e o tempo de descanso. O volume do pão e outras propriedades de panificação diminuiram com o aumento dos níveis de farinha integral de trigo germinado.

Leelavathi & Haridas-Rao (1988) utilizaram farinha integral de trigo germinado para produzir “chapati” (produto panificado semelhante a uma “panqueca chata”, consumido na Índia e Paquistão). Observaram pela granulometria, que o trigo tornou-se mais friável com a germinação (maior quantidade de partículas finas). As características químicas da farinha mostraram que o conteúdo de glúten foi reduzido durante a germinação de 9,4 para 8,8 %, provavelmente, devido à degradação durante a germinação; os açúcares redutores e a atividade diastática aumentaram no trigo germinado. A farinha obtida de trigo germinado necessitou menos água (59,4%) do que a farinha integral controle (68,6%) para preparar a massa de “chapati”; conseqüentemente, o rendimento de “chapati” foi menor. A menor absorção de água foi, possivelmente, devido à degradação do glúten bem como da perda de carboidratos. Chapati feito com trigo germinado armazenado por 4 dias apresentou melhor textura e aceitabilidade global, provavelmente devido ao maior teor de açúcares e dextrinas que conferem maior capacidade de reter água.

Os pesquisadores da Embrapa-CNPSA de Concórdia-SC, usaram o trigo germinado no campo (cultivar EMBRAPA 16) para rações de suínos e aves, não encontrando interferência do grau de germinação no desempenho dos animais (Pieniz et al., 1996 e Lima et al., 1998). A composição química em base úmida do trigo com 14% de grãos germinados foi: 86,99% de matéria seca (88,45% do trigo controle), 12,82% de proteína bruta (11,03% controle), 1,35% de extrato etéreo (1,57% controle) e 3,20% de fibra bruta (2,91% controle).


 

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