Novembro, 2009
105
Passo Fundo, RS
Principais contaminantes de trigo na fase de pós-colheita

A partir do diagnóstico do sistema APPCC realizado foram identificados os principais contaminantes do trigo que serão abordados a seguir.

Fungos toxigênicos e micotoxinas

As micotoxinas são compostos tóxicos que ocorrem naturalmente e são produzidos por fungos que se desenvolvem em produtos agrícolas, tanto durante seu crescimento no campo, quanto no armazenamento, bem como em alimentos processados e rações para animais (SCUSSEL, 2002). Os maiores danos ocasionados pelo desenvolvimento fúngico em grãos e sementes armazenados são: perda do poder germinativo, perda de matéria seca, alteração do valor nutricional e contaminação por micotoxinas (LAZZARI, 1993).

A ingestão de alimentos contaminados com micotoxinas pode provocar manifestações hepatotóxicas, nefrotóxicas, mutagênicas, teratogênicas, estrogênicas, neurotóxicas, imunossupressoras e carcinogênicas em humanos e em animais (BIRCK, 2005; EGMOND et al., 2007). Em condições experimentais, a alimentação de animais com rações contendo micotoxinas em baixas concentrações, aumenta a suscetibilidade a doenças causadas por bactérias, fungos ou vírus, gerando importantes implicações também para a saúde humana (MILLER, 2008). Há estudos indicando que humanos apresentam alta sensibilidade a deoxinivalenol, comparável aos sintomas apresentados por suínos (MILLER, 2008).

Em trigo, os danos provocados por insetos-praga durante o armazenamento são um dos principais fatores predisponentes ao desenvolvimento de fungos toxigênicos. A produção de micotoxinas também está relacionada com: estresse da planta causado por extremos climáticos (temperaturas atípicas), danos mecânicos e deficiências minerais e/ou hídricas (PRANDINI et al., 2008). No armazenamento, os fatores causadores de produção de micotoxinas, que são os mesmos que predispõem o desenvolvimento de fungos, incluem: alto teor de umidade dos grãos, alta temperatura, longo período de armazenamento associado a alta temperatura e umidade, grãos danificados, altos níveis de dióxido de carbono e de oxigênio, alta quantidade de esporos e presença de vetores como insetos e ácaros (BIRCK, 2005).

A giberela, causada pelo fungo Gibberella zeae (Schw.) Petch (anamorfo: Fusarium graminearum Schwabe), é uma das principais doenças do trigo no mundo. Além de ocasionar expressivas perdas de produtividade, possui grande importância devido a associação com o desenvolvimento/acumulação de micotoxinas (XU et al., 2008). A espécie Fusarium graminearum produz as toxinas tricotecenos (deoxinivalenol - DON, nivalenol e toxina T-2) e zearalenona (ZEA), que devido a sua ampla e frequente ocorrência, são as mais importantes. DON é provavelmente a micotoxina mais extensamente distribuída nos alimentos e rações (MILLER, 1995). No Brasil, a micotoxina DON, é a toxina de Fusarium mais corrente. Contamina diversos cereais, especialmente trigo, cevada e milho. Os efeitos da atividade de água e da temperatura sobre o comportamento dos fungos do gênero Fusarium, ainda precisa ser melhor estudado. A temperatura ótima para o desenvolvimento do fungo é de 20 – 25ºC e a atividade de água mínima para o crescimento é de 0,90. Entretanto, a toxina ZEA é produzida em temperaturas de 12ºC e, para a produção da toxina T-2, a temperatura ideal é de 8ºC, indicando que o Fusarium produz toxinas quando está sob efeito de choque térmico (SCUSSEL, 2002).

Resíduos de agroquímicos

A atenção para a presença de resíduos químicos vem crescendo nas últimas décadas em decorrência de estudos que demonstram seus altos níveis nos alimentos, relacionando-os a graves problemas na saúde humana. Para trigo, os pesticidas utilizados na produção a campo, em geral, são metabolizados dentro do intervalo de segurança. Dessa forma, não permanecem resíduos nos grãos por ocasião da colheita. Em pós-colheita, a utilização de inseticidas organofosforados e piretróides para o controle de pragas em grãos armazenados, é um dos métodos mais adotados atualmente. O tratamento preventivo consiste na aplicação do inseticida via líquida sobre os grãos na correia transportadora, no momento do abastecimento do silo. Esse tratamento confere proteção contra a infestação por pragas durante o armazenamento por períodos maiores de três meses. Entretanto, esses produtos apresentam restrições ao uso devido aos problemas de persistência nos grãos e nos subprodutos na forma de resíduos, além da ocorrência de resistência das pragas aos inseticidas.

O controle oficial de resíduos de pesticidas em alimentos é baseado nos limites máximos de resíduos (LMRs) e no intervalo de segurança. Para garantir a segurança dos alimentos que são disponibilizados para consumidores, quanto ao nível de resíduos de pesticidas, os LMRs são definidos pela FAO, pela Comissão do Codex Alimentarius e pela Organização Mundial da Saúde (OMS), determinando a concentração máxima de resíduo que poderá ser ingerida diariamente através da alimentação, prevenindo danos à saúde dos consumidores. Esses limites também são estabelecidos para produtos destinados à alimentação de animais. No Brasil, a regulamentação do LMR e do intervalo de segurança para pesticidas é responsabilidade da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA, 2003a). Na Tabela 6 podem ser visualizados os LMR estabelecidos para os inseticidas indicados para utilização na fase de pós-colheita de trigo.

Insetos-praga e fragmentos

Os insetos-praga são os contaminantes de grãos mais importantes, devido aos grandes prejuízos para a qualidade e por sua relação direta com outras contaminações como a proliferação de fungos e a produção de micotoxinas. Por outro lado, a presença de fragmentos de insetos, nos produtos finais, causa expressivos prejuízos para a cadeia produtiva, gerando perdas econômicas e a falta de credibilidade junto aos consumidores. Na comercialização de grãos de trigo, não é tolerado a presença de qualquer inseto vivo no lote. O conhecimento de informações sobre cada espécie-praga, como descrição, biologia, hábito alimentar e danos, constitui-se elemento importante para definir a melhor estratégia de manejo para evitar os respectivos prejuízos.

Segundo o hábito alimentar, as pragas podem ser classificadas em primárias ou secundárias. As pragas primárias são aquelas que atacam grãos inteiros e sadios e, dependendo da parte do grão que atacam, podem ser denominadas pragas primárias internas ou externas. As primárias internas perfuram os grãos e neles penetram para completar seu desenvolvimento. Alimentam-se de todo o interior do grão e possibilitam a instalação de outros agentes de deterioração dos grãos. Exemplos dessas pragas são as espécies Rhyzopertha dominica, Sitophilus oryzae e S. zeamais. As pragas primárias externas destroem a parte exterior do grão (casca) e, posteriormente, alimentam-se da parte interna sem, no entanto, se desenvolverem em seu interior. Há destruição do grão apenas para fins de alimentação. Exemplo deste tipo de praga é a traça Plodia interpunctella (LORINI, 2005). As pragas secundárias não conseguem atacar grãos inteiros, requerem que os grãos estejam danificados, quebrados ou ainda atacados por pragas primárias para deles se alimentarem. Essas pragas multiplicam-se rapidamente e causam prejuízos elevados. Como exemplos citam-se as espécies Cryptolestes ferrugineus, Oryzaephilus surinamensis e Tribolium castaneum (LORINI, 2005).

Existem dois importantes grupos de pragas que atacam grãos armazenados: besouros e traças. Entre os besouros encontram-se as espécies: R. dominica (F.), Sitophilus oryzae (L.), S. zeamais (Motschulsky), T. castaneum (Herbst), O. surinamensis (L.), e C. ferrugineus (Stephens). As espécies de traças mais importantes são: Sitotroga cerealella (Olivier), P. interpunctella (Hübner), Ephestia kuehniella (Zeller) e Ephestia elutella (Hübner). Entre essas pragas, R. dominica, S. oryzae e S. zeamais são as que causam maior dano econômico e justificam a maior parte do controle químico, praticado nas unidades armazenadoras. A descrição e biologia das principais pragas de grãos armazenados pode ser consultada em Lorini (2005).

Birck (2005), em estudo das condições higiênico-sanitárias em grãos de trigo armazenado e no processamento de farinhas de trigo comum e especial, identificou prejuízos relacionados com a presença de insetos-praga. A autora verificou que 100% de doze amostras de trigo apresentaram infestação de um a cinco insetos, e as seis amostras de farinha especial e comum analisadas apresentaram de seis a 45 fragmentos de insetos por amostra. Esses resultados já eram esperados, uma vez que o trigo usado na produção dessas farinhas apresentou infestação interna na massa de grãos. Devido ao processo de moagem, esses insetos resultam em grande quantidade de fragmentos.


 

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