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Estratégias para reduzir riscos por estiagens

Homero Bergamaschi
Prof. Adjunto, Depart. Plantas Forrageiras e Agrometeorologia, Fac. Agronomia, UFRGS


A ocorrência de estiagens nos meses de primavera-verão é, sem dúvida, a principal causa de redução da produção agropecuária na Região Sul do Brasil, como de resto na maior parte do Cone Sul. Trata-se de um extraordinário fator de risco, sempre temido pelo agropecuarista, cuja maior freqüência se dá nos meses de alta demanda evaporativa atmosférica. No Rio Grande do Sul, dados da EMATER/RS apresentados por Berlato & Fontana (1998) mostram que períodos secos, associados ou não ao fenômeno "La Niña", continuam sendo o fator climático de maior impacto negativo na produção agrícola. Pode-se dizer que toda a cadeia produtiva agropecuária é enormemente afetada em anos de estiagem, cujos reflexos se verificam em outros setores, de maneira direta ou indireta.

A Climatologia tem-se ocupado em descrever e quantificar, para os mais diferentes fins, as variações na distribuição das chuvas, permitindo melhor planejar e zonear atividades agropecuárias. Recentemente, avanços nos estudos do fenômeno El Niño Oscilação Sul tem permitido prever, com certa segurança, variações estacionais no regime de chuvas em muitas regiões, dentre as quais o Sul do Brasil. Exemplo disto, foi o êxito na previsão, com antecedência de alguns meses, de que os períodos estivais de 1997/98 (El Niño) e 1998/99 (La Niña) seriam, respectivamente, mais e menos chuvosos do que o normal.

Entretanto, uma adequada disponibilidade de água às plantas não depende apenas da quantidade de chuva; depende, também, da demanda hídrica da cultura e da capacidade do solo em armazenar água disponível. O solo tem a função de suprir as culturas, entre uma chuva e outra, a partir da água armazenada no perfil. Daí decorre a importância de um adequado manejo do solo e da água armazenada, para os períodos sem chuva. Por outro lado, a necessidade da cultura dependerá da demanda evaporativa atmosférica e do estágio de desenvolvimento das plantas. O consumo de água das plantas varia de acordo com a sua área transpirante. Com isto, verifica-se nos meses de final de primavera e verão a maior demanda hídrica das culturas, sob elevada demanda atmosférica e máxima área foliar.

Na combinação de fatores, balanços hídricos normais acusam, para a maior parte do Rio Grande do Sul, excedentes hídricos em culturas de outono-inverno e déficit hídrico em culturas de primavera-verão, na maior parte do ciclo (Westphalen, 1983; Berlato et al., 1986; Aragonés at al., 1997; Silva & Bergamaschi, 1998).

Por outro lado, o impacto de um déficit hídrico sobre o rendimento econômico de uma cultura depende das características da mesma, da intensidade do estresse e do momento (crítico ou não com relação ao estresse) em que as plantas são atingidas. Dados recentes de Bergonci at al. (1998) demonstram, em milho, a pouca tolerância da espécie ao estresse durante a formação dos componentes do rendimento. Em geral, as culturas em período crítico podem ter seu rendimento afetado mesmo por estiagens de curta duração. Ao contrário, em períodos não críticos, riscos maiores somente ocorrem em estiagens prolongadas, ou em solos com baixa capacidade de armazenagem de água. Baseados em Doorenbos & Kassan (1979), Cunha & Bergamaschi (1992) descrevem os chamados períodos críticos de inúmeras culturas de interesse para o Rio Grande do Sul.

Pelo acima exposto, vê-se que, conforme a época e a duração, as estiagens podem afetar de várias formas as culturas, de acordo com a intensidade do estresse que causam e do estádio das plantas. Pode-se dizer que, para os meses de final de outono e inverno, quando as condições normais são de excesso hídrico, raramente haverá prejuízos significativos causados por estiagens na Região Sul do Brasil. Ao contrário, cultivos de estação fria, em geral, tendem a ser beneficiados por curtas estiagens, em função de melhores condições fitossanitárias e de maior fotossíntese em períodos ensolarados.

Estiagens de primavera, do final de setembro a meados de dezembro, ainda podem beneficiar os cereais de inverno, em razão de maior fotossíntese, melhor fitossanidade e colheita facilitada. O preparo do solo e a semeadura/plantio do arroz (em várzeas) também podem ser facilitados em períodos sem chuvas. Por outro lado, o feijão da "safra" pode ser atingido em período crítico, com grande risco. O estabelecimento de milho, soja e forrageiras de verão poderão ser comprometidos. Hortaliças não irrigadas podem ser fortemente prejudicadas e, mesmo, algumas fruteiras (pêssego e citros, por exemplo) podem ser afetadas.

Estiagens de verão, de meados de dezembro ao final de março, ainda poderão beneficiar o arroz irrigado, bem como as demais culturas irrigadas ou protegidas, desde que a irrigação seja manejada adequadamente. No caso do arroz, a armazenagem de água nos mananciais pode ser crítica. Maior fluxo de radiação solar (maior fotossíntese) e atmosfera mais seca (melhor fitossanidade) tendem a elevar os tetos de rendimento, facilitar os tratos culturais e a colheita, além de permitir produtos de melhor qualidade. Pelos mesmos motivos, algumas espécies frutíferas, como maçã e videira, também podem ser beneficiadas por estiagens, tanto em rendimento como em qualidade do produto colhido.

Ainda nos meses de verão, culturas de estação quente, como milho e soja, em geral são atingidas em período crítico. Neste caso, os prejuizos tendem a ser elevados. A produção de hortaliças não irrigadas pode ser totalmente inviabilizada e, mesmo, algumas fruteiras não irrigadas podem ser afetadas. Forrageiras de um modo geral, terão comprometidos tanto o crescimento e a produção como a persistência de algumas espécies perenes. Porém, a produção de sementes de algumas forrageiras, como alfafa, pode ser beneficiada por estiagens curtas.

Ao definir estratégias para reduzir riscos tem-se que levar em conta que estiagens curtas são mais prováveis e mais facilmente contornáveis através da combinação adequada de práticas de cultivo. Por outro lado, estiagens mais longas, embora menos freqüentes, são mais dificeis de contornar por simples práticas de manejo; porém, é possível reduzir significativamente os riscos e os danos decorrentes, se houver orientação e planejamento adequado de atividades, em nível de propriedade. Neste caso, a irrigação pode ser a solução economicamente viável para culturas sensíveis ao déficit hídrico, cuja produção (em geral, maior, mais estável e de melhor qualidade) possa remunerar o investimento.

Na safra 1998/99, foi divulgado alerta pelos centros mundiais de previsão de tempo e clima sobre condições que caracterizam o fenômeno "La Niña", com a provável ocorrência de longa estiagem nos Estados do Sul do Brasil nos meses próximos, da primavera ao outono. Com isto, a Secretaria da Agricultura e Abastecimento do Rio Grande do Sul, em conjunto com a Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária, então ligada à Secretaria de Ciência e Tecnologia do RS, passaram a coordenar um grupo interinstitucional, a partir de julho de 1998, com o objetivo de acompanhar a evolução do fenômeno e elaborar recomendações aos técnicos e produtores. As Instituições participantes foram: UFRGS, UFPEL, UFSM, INMET/8oDISME, EMATER/RS, EMBRAPA/TRIGO, EMBRAPA/CPACT, FECOAGRO, IRGA, FUNDACEP, FAMURS, IICA/OEA e CEEE/SGH. De julho a dezembro de 1998, foram realizadas cinco reuniões do grupo, durante as quais, a partir de apresentações e debates, era feito um diagnóstico da evolução do fenômeno em escala mundial, avaliando-se a situação meteorológico-climática e suas conseqüências em nível de Estado, sendo, então, formuladas (ou revisadas, conforme o caso) orientações aos técnicos e produtores. Ao final de cada encontro, era elaborada uma Circular oficial da SAA/RS para ampla divulgação aos agricultores e entidades do setor primário. As orientações eram de caráter geral, para todas as culturas, e específicas, para algumas espécies em particular. Ao elaborar o elenco de orientações técnicas, o grupo teve o cuidado de não alterar as recomendações técnicas oficiais em vigência, somente salientando ou acrescentando aquelas medidas necessárias a minimizar riscos e prejuízos decorrentes de uma provável estiagem prolongada. Algumas dessas medidas já constavam em orientações vigentes, fruto de pesquisas e experiências anteriores, conforme referiu-se Barni (1992).

As orientações técnicas gerais, aqui apresentadas de forma resumida, foram (Rio Grande do Sul, 1998):

  1. Mobilizar o solo o mínimo possível por ocasião do preparo;
  2. Descompactar o solo, quando necessário;
  3. Dar preferência ao plantio direto;
  4. Não utilizar população de plantas superior ao recomendado;
  5. Escalonar as épocas de semeadura/plantio, utilizando cultivares de ciclos diferentes;
  6. Implantar as culturas sob adequadas condições de umidade e temperatura do solo;
  7. Evitar o esvaziamento de barragens;
  8. Racionalizar o uso da água disponível;
  9. Observar o zoneamento agrícola;
  10. Acompanhar as informações sobre o assunto e consultar a assistância técnica.

 

Para culturas, em particular, foram emitidas as seguintes orientações específicas:

1. Soja

  1. Escalonar épocas de semeadura e ciclos de cultivares;
  2. Utilizar cultivares de ciclo longo em semeaduras de outubro;
  3. Utilizar tratamento de sementes.
  4. Na Circular de 15/12:
    • A partir de 5/12, semear somente cultivares semi-tardias e tardias;
    • Reivindica-se ao Ministério da Agricultura e Abastecimento a data limite de 31/12/98 para PROAGRO e financiamento.

2. Milho

  1. Escalonar épocas de semeadura e ciclos de cultivares (para escalonar períodos críticos);
  2. Não utilizar populações de plantas superiores ao recomendado.
  3. Na Circular de 23/7:
  4. Nas regiões com temperatura e umidade adequadas semear, em agosto, cultivares super-precoces e precoces.

3. Feijão (safra) – exceto na Circular de 15/12:

  1. Utilizar cultivares com sistema radicular mais profundo – Rio Tibagi, Guapo Brilhante, FT Nobre e IAPAR 44;
  2. Não utilizar consórcio de culturas;
  3. Dar preferência ao plantio direto para controle de plantas daninhas.

4. Batata (safra) – exceto na Circular de 15/12:

  1. Dar preferência ao plantio no início da época recomendada;
  2. Irrigar, quando possível;
  3. Seguir as orientações gerais e consultar a assistência técnica.

5. Cebola – exceto na Circular de 15/12:

  1. Dar preferência a cultivares precoces;
  2. Dar preferência a áreas mais baixas;
  3. Irrigar, quando possível;
  4. Seguir as orientações gerais e consultar a assistência técnica.

6. Hortaliças – omitido na Circular de 15/12:

  1. Aumentar a capacidade dos reservatórios de água;
  2. Em estufa, dar preferência à irrigação por gotejamento, para racionalizar a água;
  3. Usar cobertura morta sobre o solo, se possível;
  4. Sombrear hortaliças folhosas. Se for por tela plástica, usar índice de 30%.

7. Fruticultura – omitido na Circular de 15/12;

  1. Fazer o dessecamento e/ou rolagem da vegetação de inverno mais cedo;
  2. Usar raleito de frutos como prática indispensável.

8. Forrageiras:

Aumentar o estoque de forragens na propriedade, seja no campo através de carga (aliviar a carga animal) e do diferimento* de potreiros desde o final do inverno, quando possível, seja através de forragens conservadas (feno ou silagem);

(*Diferimento de primavera: fechar o potreiro do final de agosto ao final de novembro).

Nas forrageiras cultivadas de verão, antecipar ao máximo o plantio/semeadura e utilizar mudas/sementes de alto vigor;

No manejo das forrageiras e pastagens, procurar manter a cobertura do solo, através de resíduo (resteva) relativamente alto;

Lembrar que períodos de descanso (sem a presença de animais por 40-45 dias) servem para promover o aprofundamento de raízes e resultam em maior acúmulo de matéria seca aérea.

Talvez, o grupo não tenha avançado até onde podia ou devia, ficando no limite das tecnologias de baixo investimento e não demandando mudanças significativas nos sistemas de produção. Torna-se difícil quantificar o retorno da aplicação do elenco de medidas preconizado, mas acredita-se que foi possível evitar grandes prejuízos ao setor ou até frustrações elevadas, em muitos casos. Por outro lado, a partir de informações mais recentes, pode-se inferir que os trabalhos de extensão poderão avançar mais, buscando elevar e estabilizar os tetos de rendimento, o que demandará algum esforço no sentido de melhor capacitação de técnicos e produtores, além de maior volume de recursos investidos. É o caso da irrigação, como parte integrante de um elenco de práticas de manejo destinadas a elevar e assegurar a produção. Exemplo disto é o da cultura do milho, de importância estratégica ao setor primário, para a qual a incorporação de novas tecnologias é dificultada e limitante, por uma série de razões. A análise da cadeia produtiva do milho (Machado et al., 1998) demonstrou que o custo de produção da saca de grãos é consideravelmente reduzido se a irrigação for incluída no conjunto de um sistema de produção mais moderno, tornando a cultura mais rentável e mais segura ao produtor e ao setor como um todo.

 

BIBLIOGRAFIA CITADA

ARAGONÉS, R.S.; BERGAMASCHI, H.; RADIN, B; FRANÇA, S; BERGONCI, J.I. 1997. Evapotranspiração do milho relacionada ao crescimento das plantas e à demanda evaporativa atmosférica. In: SALÃO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA, 9 ...Livro de Resumos. Porto Alegre, UFRGS/PROPESQ. p. 104.

BARNI, N.A. 1992. Práticas agrícolas para minorar o impacto das secas e racionalizar a irrigação. In: BERGAMASCHI, H., Coord. 1992. Agrometeorologia aplicada à irrigação. Porto Alegre, Editora da Universidade/UFRGS. 125p.

BERGONCI, J.I.; BERGAMASCHI, H.; SANTOS, A.O.; FRANÇA, S.; RADIN, R. 1998. Eficiência no uso da irrigação em milho, aplicada em diferentes níveis e estádios da cultura. In: REUNIÃO ANUAL DO MILHO, 43 E REUNIÃO DO SORGO, 26 ... Resumos. Veranópolis, RS (no prelo).

BERLATO, M.A.; MATZENAUER, R.; BERGAMASCHI, H. 1986. Evapotranspiração máxima da soja e relações com a evapotranspiração calculada pela equação de Penman, evaporação do tanque "classe A"e radiação solar global. Agronomia Sulriograndense. Porto Alegre, IPAGRO/Secret. Agricultura RS, 22(2):243-59.

BERLATO, M.A.; FONTANA, D.C. 1998. El Niño e a agricultura da Região Sul do Brasil. In: CICLOS DE PALESTRAS DA FEPAGRO ... Anais. Porto Alegre, FEPAGRO/ SCT-RS. p. 113-26.

CUNHA, G.R.; BERGAMASCHI, H. 1992. Efeitos da disponibilidade hídrica sobre o rendimento das culturas. In: BERGAMASCHI, H., Coord.. 1992. Agrometeorologia aplicada à irrigação. Porto Alegre, Editora da Universidade/UFRGS. 125p.

DOORENBOS,J.; KASSAN, A.H. 1979. Efectos del água sobre el rendimiento de los cultivos. Roma, FAO. 212p. (Estudios FAO: riego y drenage, 33).

MACHADO, R.; BELTRÃO, L.; COLLE, C.A.; ALMEIDA, A.P. 1998. Estudo da cadeia produtiva do milho. Porto Alegre, FEPAGRO/Secr. Ciência e Tecnologia. Cadeias Produtivas, n. 2. 56p.

RIO GRANDE DO SUL. 1998. Circular SAA 1 a 5. Porto Alegre, Secretaria de Estado da Agricultura e Abastecimento, julho a dezembro de 1998.

SILVA, M.I.G.; BERGAMASCHI, H. 1998. Evapotranspiração de uma mistura de aveia preta + ervilhaca associada à demanda evaporativa atmosférica. In: SALÃO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA, 10 ... Livro de Resumos. Porto Alegre, UFRGS/ PROPESQ. 1998. p. 105.

WETPHALEN, S.L. 1983. Evapotranspiração máxima de um cultivar precoce de trigo em evapotranspirômetro "tipo Thornthwaite" e relações com tanque classe A e radiação solar. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE AGROMETEOROLOGIA, 3 ... Resumos. . Campinas, SP, Soc. Bras. Agromet./IAC-SAAESP p.. 19.


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