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Saiu o trigo e chegou a crise

Gilberto R. Cunha
Embrapa Trigo, Caixa Postal 451, CEP 99001-970 Passo Fundo, RS. 

Tem nuanças de verdade a percepção de que foi quando saiu o trigo das lavouras que chegou a crise no meio rural rio-grandense. Por razões óbvias não se pode creditar todas as mazelas econômicas dos produtores gaúchos ao fato de muitos deles terem, nos últimos anos, deixado de plantar trigo. Até mesmo porque crise na agricultura gaúcha não é uma coisa nova. Pelo jeito sempre rondou estas plagas. Exceto, talvez, no auge do período de intervenção estatal na economia, cujos juros desta conta ainda estamos pagando. Mas que o abandono da triticultura trouxe conseqüências econômicas negativas é algo inegável. Particularmente naquelas explorações exclusivamente produtoras de grãos, uma vez que não se encontrou uma cultura alternativa para o período da safra de inverno que, apesar dos pesares, seja capaz de agregar renda nos mesmos níveis proporcionados pelo trigo.

Os desafios para a cultura de trigo no sul do Brasil ainda são muitos. Este tema fez parte de um painel inserido na programação da XXXII Reunião da Comissão Sul-brasileira de Pesquisa de Trigo (RCSBPT), realizada em Cruz Alta, RS, de 27 a 29 de março de 2000. Nele foram expostas e debatidas as visões do comércio e indústria de trigo, dos produtores, cooperativas e organizações de classe e do governo (federal e estadual). Ou seja, procurou-se conhecer com maiores detalhes as opiniões e sentimentos dos diferentes segmentos atuantes no complexo agro-industrial de trigo no Brasil.

O representante da área comercial, Jairo Faccio, da JF Corretora, com sede em Casca, RS, que, segundo informou na apresentação, intermedia a comercialização de 60% do trigo produzido no Brasil, destacou que o preço pago e as dificuldades de comercialização do trigo nacional tem muito a ver com a qualidade do produto. Sendo, é claro, o preço pago ao produtor balizado pela cotação do dólar e pelos preços do mercado internacional, particularmente, no nosso caso, do trigo argentino. Por isso, salientou ele, a importância de se fazer um manejo adequado das lavouras para que se possa produzir um trigo com qualidade adequada para a indústria. Começando com a escolha certa da cultivar a ser plantada e tudo o mais que envolve a condução de uma lavoura tecnicamente assistida. E, acima de tudo, manter a qualidade do produto na armazenagem. Não se deve fazer mistura de grãos com qualidade diferentes, pois isso nivela o preço por baixo. O trigo não pode perder identidade na fonte.

Com relação à perspectiva de preço de comercialização para o trigo brasileiro da safra 2000, Faccio argumentou que fazer uma projeção neste momento, véspera de plantio, não é uma coisa trivial. De qualquer modo, se não houver maiores alterações no câmbio e no mercado internacional de trigo, é possível a obtenção de um preço ao redor de R$ 12,00 e R$ 13,00 por saco, produto com qualidade , tipos 1 e 2. Além de que o trigo para a indústria de ração animal poderá ter novamente uma boa liquidez, embora com preço inferior (ao redor de R$ 10,00 por saco).

Na qualidade de debatedor representante da indústria moageira de trigo no Brasil, o economista Reino Pécala Rae foi taxativo ao afirmar que, hoje, quem determina o preço do trigo é o mercado. Destacou ainda que, até 1990, toda a cadeia de trigo no Brasil era tutelada pelo Estado: da produção à moagem. E isto foi negativo, a preocupação com a qualidade do produto e a competitividade mercadológica, por exemplo, foram deixadas de lado. Por isso, cada vez mais, é imprescindível estudar e conhecer o mercado de trigo para não se ter expectativas frustradas. Assim, recomenda ele, que se deve ter uma certa cautela com a "tendência" de especializar ou rotular o Rio Grande do Sul como produtor típico de trigo brando, pois o mercado é pequeno. Na visão dele, os principais entraves da triticultura brasileira estão nos subsídios pagos nos países de origem do trigo que o Brasil importa e o tal de "custo Brasil", pois é preciso competitividade também no escoamento da produção. Rae fez o alerta de que a Argentina vendeu para o Brasil, no ano de 1999, em números redondos, em torno de sete milhões de toneladas de trigo. E de um produto com qualidade não lá essas coisas. O aumento de produção na Argentina fez a qualidade do seu trigo cair. Ninguém no mundo tem um comprador deste calibre. Ruim para nós, bom para os argentinos, pelo menos por enquanto.

O segmento das cooperativas, representado na opinião de Armindo Terhorst, da Cotrisa, de Santo Ângelo, RS, acredita que desburocratizar financiamentos e liberar crédito rural seria uma das coisas necessárias para o reerguimento da triticultura sul-brasileira. Um pedido difícil de ser atendido em tempos de economia neoliberal, onde avaliações de garantias e de capacidade de pagamento estão sendo cada vez mais exigidos. Tehorst foi mais além, indicando que as cooperativas podem fazer a sua parte no que tange à melhoria das condições de armazenagem e incentivar a cultura de trigo. Até porque não existem muitas outras opções no horizonte, quando o assunto é o que plantar de grãos no inverno. Acha ainda importante o estabelecimento de parcerias entre produtores, moinhos e indústria, mediante contratos de entrega futura de produto, como mecanismo de estímulo ao plantio de trigo.

Na pele dos produtores de trigo, teve vez e voz no painel, Ulfried Arns, da Granja Arns, de Cruz Alta. Destacou ele que os preços agrícolas caíram de forma drástica nos anos 90. E é neste cenário que os triticultores brasileiros tiveram e terão que encontrar o seu caminho. Para isso, na sua opinião e experiência, optar por um modelo tecnológico que reduz a dependência de insumos externos à propriedade é o primeiro passo. E nesta linha, não faltam alternativas tecnológicas criadas pelas pesquisa brasileira. Citam-se: sistema plantio direto, esquemas de rotação de culturas, adubação orgânica via culturas de cobertura, cultivares adaptadas aos diferentes ambientes, etc. De qualquer modo, Ulfried Arns considera trigo uma cultura economicamente viável no sul do Brasil, quer seja pela opinião verbalizada ou simplesmente pelo fato que nunca deixou de plantá-lo na sua propriedade.

A visão de triticultura pelas esferas federal e estadual foi dada por José Maria dos Anjos, representando Benedito Rosa do Espírito Santo do Ministério da Agricultura e do Abastecimento, e por José Hermeto Hoffmann, Secretário da Agricultura/RS. O primeiro deu destacou o fato de que o Brasil deverá importar, no ano 2000, cerca de 7,5 milhões de toneladas de trigo para atender o consumo interno e gastar com isso perto de 900 milhões de dólares. Além de que a safra de 1999 foi a melhor, em termos de comercialização de trigo no Brasil, desde o fim da intervenção estatal, em 1990. Pois não existiu qualquer tipo de intervenção federal, seja com PEP ou AGF. Uma verdadeira êxtase, pelos princípios neoliberais vigentes.

O secretário José Hermeto Hoffmann foi enfático ao afirmar que é preciso revigorar a triticultura gaúcha. Não dá para se ter terras ociosas no inverno e viver uma perigosa dependência externa deste cereal. Entende ele que o problema do trigo não é técnico. Depende de políticas macroeconômicas globais. E que os segmentos que compartilham desta idéia devem se unir, acima de interesses individuais, para viabilizar renda aos produtores na safra de inverno. Hoffmann vê no trigo a capacidade de gerar rapidamente 50 mil empregos no estado. Uma coisa socialmente muito desejável.

As opiniões dos painelistas e os resultados de trabalhos de pesquisa apresentados nas sessões técnica da XXXII RCSBPT reforçam a certeza de que o sul do Brasil pode e deve produzir trigo. Um mercado consumidor da magnitude do Brasil, previsão ao redor de 10 milhões de toneladas no ano 2000, não se encontra em qualquer esquina. Também é evidente que, nos tempos atuais, precisa-se ter capacidade competitiva em qualidade e em preço. E que não é com protecionismo estatal que se vai viabilizar isto. Tampouco se vai conseguir esta almejada competitividade fechando os olhos à internalização de subsídio pagos nos países que exportam trigo para o Brasil ou recebendo este produto como moeda de troca em acordos comerciais internacionais. Com certeza, o Brasil e particularmente o Rio Grande do Sul que, nos últimos 20 anos, abdicou de plantar 800 mil hectares de trigo estão muito mais pobres, deixando de gerar riquezas e arrecadar tributos, optando por gastar com importações daquilo que poderia naturalmente ser produzido aqui. Por tudo isso, fica a certeza de que, pelo menos por enquanto, quanto menos trigo nas nossas lavouras de inverno maior será a nossa crise na agricultura.


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