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O Cavvaliere e o Trigo

Gilberto R. Cunha
Embrapa Trigo, Caixa Postal 451, CEP 99001-970 Passo Fundo, RS. 

A lavoura de trigo no Brasil, com finalidade comercial, começou efetivamente no Rio Grande do Sul. Há várias referências indicando que, após a fracassada experiência dos açorianos, por volta de 1740, e de um tímido recomeço com a colonização alemã, em 1824, o cultivo de trigo de fato se consolidou foi com a vinda dos imigrantes italianos, depois de 1875. E a maioria fica por aí. Não acrescentando nada além da informação genérica.

Para os interessados em conhecer um pouco da chamada triticultura colonial dos italianos, recomenda-se a leitura do livro "O Cavvaliere Aristides Germani", escrito por Campos Neto, em 1939. A citada obra teve três edições: a primeira em outubro de 1939, a segunda em dezembro daquele mesmo ano (uma reimpressão) e a terceira, por iniciativa da Universidade de Caxias do Sul e da Escola Superior de Teologia São Lourenço de Brindes, em outubro de 1978. Todas estão esgotadas, porém exemplares desta última são facilmente encontrados nos sebos (livrarias que vendem livros usados) do centro de Porto Alegre.

Na verdade, Campos Neto faz uma descrição da trajetória pessoal, econômica, política e social de Aristides Germani, com quem mantinha relações familiares desde o tempo que seu pai, Campos Júnior, fora intendente municipal em Caxias do Sul. Trata-se de uma biografia feita para homenagear aquele que é considerado uma das mais fascinantes figuras da imigração italiana. Apresenta detalhes pessoais, de interesse exclusivo para a família do biografado, e dá destaque à batalha travada por Aristides Germani a favor da triticultura brasileira e da sua industrialização. E é esta última, sem dúvida, a parte mais interessante do livro. Há que se considerar também, além da relação pessoal de Campos Neto com Aristides Germani, que acaba se refletindo na idealização de algumas passagens em que o biografado aparece como herói deslocado do momento histórico, que o livro foi escrito em 1939, por conseqüência, refletindo alguns preconceitos nacionalistas daqueles tempos de Estado Novo. Porém, isso em nada diminuí o valor da obra, que reitera-se indispensável para se conhecer a história da cultura de trigo no País, com alguns aspectos ainda atuais, neste fim de século.

Aristides Germani nasceu em 16 de junho de 1863, na comuna de Corte di Frati, província de Cremona, Itália. E foi lá que aprendeu o ofício que o consagraria na profissão de moageiro de trigo. Aos quinze anos, começou a trabalhar no moinho de Giácomo Tansini, onde ficou por quase seis anos. Depois entrou para o moinho de Pelini Pangélo, trabalhando, neste estabelecimento, até o ano de 1885, quando resolveu vir para a América visitar o tio Emmanuele Santini que emigrara para o Brasil e residia na colônia Campo dos Bugres, no Rio Grande do Sul, desde 1875.

E assim, pelo que consta, Aristides Germani partiu de Gênova no dia 18 de agosto de 1885, a bordo do vapor Orione, com destino ao Rio de Janeiro, onde chegou em 6 de setembro daquele ano. Do Rio de Janeiro veio para Porto Alegre, desembarcando em 22 de setembro. No dia seguinte, seguiu viagem para Campos dos Bugres, via São Sebastião do Cai, onde ficou vários dias aguardando condução para o interior da colônia.

Finalmente, em 28 de setembro de 1885, partiu para encontrar o tio Emmanuele Santini, na XIII Légua, Travessão Cremona, em Campos dos Bugres. E foi lá que começou a trabalhar na roça, ajudando o tio a plantar, a colher, a preparar a terra, a selecionar sementes, etc. Ou seja, se dedicando às lides agrícolas. Nessa atividade, um fato deixava Aristides Germani profundamente intrigado: Por que seus patrícios italianos não plantavam trigo na nova terra, uma vez que o clima era muito parecido com o da Lombardia? Questionando seus pares sobre o porquê de não plantarem trigo, obteve como resposta que plantar trigo era tempo perdido, pela falta de moinhos. Os padeiros de Caxias do Sul, no final do século passado, usavam farinha de trigo importada da Itália e do Uruguai. Antônio Moro, um padeiro conceituado na cidade, achava desnecessário o cultivo de trigo na região. Apesar do ambiente desfavorável, Aristides Germani não desanimou e virou um "propagandista" da cultura de trigo no sul do Brasil, ensinado os colonos a plantar, a colher, a armazenar, etc o cereal. E, por isso, foi um pioneiro do renascimento da triticultura brasileira no século XIX.

Em Caxias do Sul, na época, havia três moinhos, que se dedicavam principalmente à moagem de milho e de centeio. Seus proprietários eram: Giusué Vaccari, Antônio Corsetti (arrendado a Paulo Otolini) e Giovani Venzon. Aristides Germani procurou esse pessoal dizendo-se técnico especializado em moagem de trigo, manifestando sua esperança na cultura de trigo e na sua industrialização. Queria modificar os moinhos de milho para a moagem de trigo, pois considerava o trigo uma promessa de riqueza. Começou no pequeno moinho de Paulo Otolini e acabou contratado por Giusué Vaccari. Foi neste moinho que fez a primeira peneira de seda, introduziu sistema de limpeza de grãos, produzindo a primeira farinha de trigo no Rio Grande do Sul, em dezembro de 1886. Também criou o saco de trigo com 64 quilogramas (baseado no peso específico de 80%). Com isso, aumentou o interesse pelo cultivo e industrialização de trigo na região, ressurgindo o produto no mercado rio-grandense.

Em 1887, Antônio Moro, o padeiro, mandou buscar trigo no Uruguai e distribuiu sementes para os colonos, transformando Caxias do Sul em mercado fornecedor para padarias de Bento Gonçalves e São Sebastião do Cai.

Aristides Germani deixou o moinho de Giusué Vaccari em 1888. Passou a cuidar do moinho de Luiz Antônio Feijó Jr. e depois arrendou o moinho de Antônio Corsetti. Após ter adquirido a cascata do arroio Marques do Herval, construiu o seu próprio moinho, tornando aquele estabelecimento no centro irradiador da cultura e industrialização de trigo no Brasil. Ensinou os colonos a plantar trigo, combater doenças, fazer limpeza e armazenar os grãos. O estabelecimento de Aristides Germani cresceu junto com Caxias, chamada de Pérola das Colônias, Capital das Colônias e Princesa do Norte. Em 1901, construiu uma turbina vertical no moinho, inaugurando a iluminação elétrica no interior. Posteriormente, em 1905, levantou um edifício de material no seu moinho, instalando um telefone. E, em 1910, com a abertura da estrada de ferro para Caxias do Sul, começou uma nova era de prosperidade e riqueza para a região colonial italiana.

Em 1914, na Exposição Industrial realizada em Santa Maria, a farinha de trigo produzida por Aristides Germani ganhou medalha de ouro, sendo considerada superior às outras concorrentes. Também mandou buscar sementes de trigo na Argentina, em 1915 e em 1923, fazendo troca com os agricultores caxienses. Estimulou o cultivo de trigo em Guaporé, Erechim e Passo Fundo. O trigo do Planalto era enviado para Aristides Germani pelos negociantes Saule Pagnoncelli, de Erechim, e Irmãos Bussato e Luiz Lângaro de Passo Fundo.

Aristides Germani começou a construir um novo e importante moinho em 1925, junto à Viação Férrea, em Caxias do Sul, que foi inaugurado em 1928. Nessa época, Getúlio Vargas era presidente do Estado e estimulou a triticultura. Na qualidade de lider moageiro, Aristides Germani saiu em defesa dos pequenos moinhos do interior (moinhos da capital x moinhos do interior), pregou isenção de impostos alfandegários para máquinas agrícolas e de moagem importadas, o barateamento do frete na Viação Férrea, na questão da troca de café por trigo americano chegou a recusar a quota de trigo americano que lhe cabia, lutou pelo estabelecimento de preço mínimo para o trigo e máximo de venda para a farinha, propôs o controle do comércio de trigo pelo governo e a compra obrigatória do trigo nacional. Muitas dessas idéias foram, de alguma forma, implementas no Brasil, na fase pré abertura comercial dos anos 90.

O cavvaliere Aristides Germani ajudou a construir a história da triticultura brasileira, incentivando o cultivo de trigo e sua industrialização na Serra Gaúcha. A fabricação de farinha de trigo da marca Germani começou em 1892 e seguiu com a industrialização, surgindo, nos anos 40, os biscoitos Pérola, as massas Diana etc. Das suas ações, ficou o exemplo da importância da ligação entre os elos de produção e industrialização no complexo agroindustrial do trigo brasileiro.


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