Ministério da Agricultura e do Abastecimento
Embrapa ISSN 1517-4964
Comunicado Técnico Online
Nº 43, dez./99
É necessária a descontinuidade do sistema plantio direto após dez anos de adoção?
Rainoldo Alberto Kochhann 1
José Eloir Denardin 2
Antonio Faganello 3

Introdução

Entre os sistemas de manejo de solo praticados no Sul do Brasil, o sistema plantio direto destaca-se como o mais conservacionista por não mobilizar a camada arável e por manter os resíduos culturais na superfície reduzindo, conseqüentemente, o fracionamento de agregados e, assim, contribuindo para a melhoria estrutural do solo. Com a conscientização da eficiência econômica do sistema plantio direto, sua adoção tem aumentado indiscriminadamente, atingindo na atualidade mais de 60 % da área cultivada no verão, no estado do Rio Grande do Sul. Entretanto, a adoção do sistema plantio direto, para exploração anual de grãos, principalmente em solos de textura muito argilosa, tem despertado preocupação para uma aparente degradação estrutural do solo, subsidiada por dados de pesquisa que demonstram redução da macroporosidade e elevação da densidade do solo. A avaliação da magnitude desse problema e de sua interferência no potencial de produtividade, portanto, requer estudos.

Com base nessa preocupação, foram avaliadas técnicas de manejo químico e físico do solo, envolvendo descontinuidade ou não do sistema plantio direto, em um Latossolo Vermelho aluminoférrico típico, com mais de 70 % de argila, há dez anos manejado sob este sistema. Assim sendo, o grau de interferência da suposta degradação estrutural do solo no rendimento de grãos de soja e de trigo foi avaliado mediante a aplicação de tratamentos envolvendo calagem seguida, ou não, de operações mecânicas de mobilização da camada superficial do solo.

Em abril de 1997, na propriedade de Gilberto Greiwe, no município de Independência, RS, em área manejada há dez anos sob sistema plantio direto, foi instalado um ensaio em blocos inteiramente casualizados, com parcelas subdivididas, medindo 4,5 m x 10,0 m, composto por 14 tratamentos e quatro repetições (Tabela 1).

Os tratamentos de manejo de solo (parcela principal) e de correção da acidez (subparcela) foram aplicados em abril de 1997, antes do estabelecimento da cultura de aveia preta comum, destinada à cobertura de solo. Os tratamentos das sub-subparcelas, constituídos pelo emprego de semeadoras equipadas com dois conjuntos de discos duplos defasados e semeadoras equipadas com discos de corte + facas estreitas combinados com discos duplos defasados, foram aplicados, exclusivamente, por ocasião da semeadura da cultura de soja, em seqüência à aveia preta. No inverno subseqüente, foi cultivado trigo com o emprego de semeadora equipada apenas com dois conjuntos de discos duplos defasados. Em conseqüência, para a cultura de trigo, o experimento foi analisado como blocos inteiramente casualizados com parcelas divididas, perfazendo, portanto, apenas sete tratamentos, com oito repetições.

A semeadora empregada foi um protótipo desenvolvido especialmente para parcelas experimentais, com possibilidade de equipar, para a cultura de soja, discos duplos ou discos de corte + facas estreitas (sulcador), de modo independente, e para a cultura de trigo, apenas discos duplos.

Nas subparcelas que receberam calagem, o calcário foi incorporado ao solo nos tratamentos com aração (arado de discos, a 20 cm de profundidade, seguido de grade de discos) e com escarificação (escarificador com 5 hastes, a 20 cm de profundidade) e deixado na superfície do solo no tratamento em que foi mantido o sistema plantio direto.

O solo da área experimental foi amostrado antes da instalação do ensaio para conhecimento do nível de fertilidade, visando à indicação de adubação para as culturas de soja e de trigo (Tabela 2), e para o conhecimento do estado estrutural (Tabela 3). Os fertilizantes para cada cultura foram aplicados nas linhas de semeadura por meio de semeadoras.

A aveia preta comum foi estabelecida na primeira quinzena de maio de 1997 e dessecada em meados de setembro. Inocularam-se estirpes de Bradyrhizobium elkanii nas sementes de soja, cultivar Embrapa 66, e estas foram tratadas com fungicida Tecto. A semeadura foi realizada na última semana de outubro. A cultura de trigo, cultivar Embrapa 16, após tratamento de sementes, foi estabelecida no início de junho de 1998.

As práticas culturais aplicadas à aveia preta, à soja e ao trigo seguiram as recomendações básicas da pesquisa para essas culturas.

A colheita foi realizada usando-se colhedora para parcelas experimentais, e o rendimento de grãos foi corrigido para 13 % de umidade.

Os dados empregados como indicadores da necessidade, ou não, de descontinuidade do sistema plantio direto foram rendimento de grãos de soja e de trigo. Após submetidos à análise da variância, os dados foram comparados pelo teste de Tukey.

Os resultados da análise de fertilidade do solo da área experimental (Tabela 2) indicaram que o solo era ácido (pH 5,5; Al+3 25 mmolc dm-3), porém adequadamente suprido de fósforo (12 mg dm-3), de potássio (120 mg dm-3), de cálcio (42 mmolc dm-3) e de magnésio (30 mmolc dm-3), além de conter nível médio de matéria orgânica (30 mmolc dm-3).

Os resultados das análises físicas do solo da área experimental, explicitados na Tabela 3, evidenciaram, aparentemente, degradação da estrutura do solo nas camadas de 5 a 10 cm e de 10 a 15 cm de profundidade. Esses valores denotam que, após dez anos da adoção do sistema plantio direto, os problemas estruturais da camada arável, advindos do preparo convencional, ainda persistem.

A aveia preta comum, cultivada no inverno de 1997, apresentou baixa produtividade de matéria seca (2.860 kg ha-1), possivelmente em virtude da alta precipitação pluvial.

Em relação à cultura de soja, observou-se que houve resposta significativa para rendimento de grãos (Tabela 4). Entretanto, esses resultados não apresentaram consistência que configurasse segurança para destacar tratamentos alternativos à continuidade do sistema plantio direto.

Embora a análise química do solo tenha indicado necessidade de calagem, a aplicação de calcário não proporcionou resposta em rendimento de grãos de soja. De modo similar, as operações de preparo de solo necessárias à incorporação de calcário não resultaram em efeitos consistentes no parâmetro de planta avaliado. Quanto aos elementos rompedores de solo que equiparam a semeadora de soja, percebeu-se leve tendência de vantagem, em termos absolutos, para o sistema de discos duplos, porém esse efeito também não se mostrou consistente.

Em relação à cultura de trigo, observou-se que o rendimento médio de grãos não foi influenciado pelos tratamentos (Tabela 5). Portanto, nem os tratamentos de manejo de solo nem os tratamentos de correção de acidez de solo induziram respostas à produtividade de trigo.

A aparente degradação estrutural do solo, indicada pelas análises de densidade do solo e porosidade (Tabela 3), não implicou efeitos negativos sobre o rendimento das cultura de soja e de trigo. A magnitude desses parâmetros físicos de solo certamente está afetando a taxa de infiltração de água no solo e, conseqüentemente, a taxa de enxurrada, além de outras propriedades do solo, porém a metodologia aplicada para avaliar seus efeitos sobre as plantas não foi suficientemente sensível.

Do ponto de vista prático, o tratamento para a área em estudo é a continuidade do sistema plantio direto sem calagem, uma vez que os demais tratamentos implicariam agregação de custos, sejam financeiros ou energéticos.

A suposição de que a continuidade do sistema plantio direto por vários anos, principalmente em solos de textura muito argilosa, implicaria problemas de degradação estrutural do solo na camada superficial não foi confirmada neste estudo de caso.

 



1 Pesquisador da Embrapa Trigo, Caixa Postal 451, 99001-970 Passo Fundo, RS.
rainoldo@cnpt.embrapa.br
2 Pesquisador da Embrapa Trigo. denardin@cnpt.embrapa.br
3 Pesquisador da Embrapa Trigo. afaganel@cnpt.embrapa.br
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