Embrapa Trigo

Dezembro, 2004
Passo Fundo, RS

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A célula e a teoria celular

Ao examinar uma amostra de cortiça ao microscópio, em 1665, o pesquisador inglês Robert Hook (1635-1703) visualizou as paredes celulares e as denominou células (pequenas celas), conforme descreveu em suas Micrographies. Essas células foram observadas por Malpighi, por Leeuwenhook e por outros microbiologistas. O médico e botânico suíço Albrecht von Haller (1708-1777) estabeleceu que todos os tecidos vivos eram formados por fibras, tese apoiada pelo fundador da histologia, o francês Marie François Bichat (1771-1802).

O entomologista alemão Lorenz Oken (1779-1851), que afirmava que todo o ser vivo provinha de outro ser vivo (omne vivum e vivo), foi o primeiro a propor, em 1805, em termos especulativos, que todos os seres vivos eram compostos de "infusórios", termo que designava os organismos unicelulares. Em 1815, Charles de Brisseau Mirbel retomou a palavra célula em seu livro Eléments de Physiologie Végétale et de Botanique, observando que estão separadas por uma membrana. Em 1824, Henri Dutrochet (1776-1847), descobridor da osmose, observou que as células estão separadas por duas membranas, portanto, cada célula têm a sua membrana. Em 1831, o botânico escocês Robert Brown (1773-1858) estabeleceu que todas as células possuíam um núcleo.

Matthias Jakob Schleiden (1804-1881), professor de botânica em Jena, definiu as plantas, em 1838, como: "agregados de seres individuais e independentes, denominados de células."

Segundo ele, as células eram formadas pela cristalização do núcleo a partir do "cytoblastema", líquido-mãe intercelular, como publicou num texto de botânica em 1842 (Grundzüge der wissenschaftlichen Botanik). Theodor Schwann (1810-1882), professor de Anatomia em Lovaina, encontrou-se com Schleiden, em 1838, oportunidade em que falaram sobre as células vegetais, indo até o laboratório para observarem células de animais ao microscópio.

Schwann compreendeu a importância da célula e dedicou-se sistematicamente à observação de células em diversos tecidos de animais. Em 1839, publicou o trabalho: "Investigações microscópicas sobre a similitude da estrutura e do crescimento de Animais e Plantas" (Mikroskopische Untersuchungen über die Übereinstimmung in der Struktur und dem Wachstum der Tieren und Pflanzen), estendendo a teoria celular ao reino animal. Posteriormente, desenvolveu-a em capítulo de um livro de fisiologia de seu compatriota Rudolph Wagner, no qual apoiava a livre formação de células de Schleiden, declarando "que as células aparecem independentes de outras no seio de um líquido organizável, o citoblastema." Supunham que as células formavam-se num processo similar ao da formação de cristais, a partir de uma solução.

Robert Remak (1815-1865), cientista alemão de origem judaica, publicou, em 1855, a obra "Investigações no Desenvolvimento dos Vertebrados" (Untersuchungen über die Entwicklung der Wirbeltiere), argumentando que as células surgiam por divisão celular, começando pela divisão dos núcleos. O citólogo suíço Albert Kölliker (1817-1905), autor de um tratado de histologia humana, (Handbuch der Gewebelehre des Menschen), começou adotando a "teoria do citoblastema", na primeira edição de 1852, mas, já na terceira edição, passou, da formação livre de células, a afirmar que nunca se forma uma nova célula sem a prévia divisão dos núcleos. Em 1855, quando era professor em Würzburg, Rudolf Virchow (1821-1902) publicou um artigo nos "Arquivos de Anatomia Patológica", no qual reconhecia o mérito de Schwann, especialmente na sua demonstração de que as células dão origem aos tecidos, e atacou a teoria do citoblastema, estabelecendo que toda a célula provém de outra célula (omnis cellula e cellula). Em 1858 publicou um livro de patologia celular (Zellulare Pathologie).

O desenvolvimento da Teoria Celular envolveu um processo muito complexo que se originou da idéia inicial, mas incompleta, de Schleiden e Schwann. As células dos organismos superiores não são independentes, mas interdependentes, e não existe a livre formação de células. Foi necessário modificá-la com as observações de Remak, até chegar à definição final, por Virchow:

1º As células são as unidades funcionais de todos os seres viventes.

2º Os fluidos intercelulares não são citoblastemas formadores de células, mas produtos derivados da atividade metabólica das células.

3º Tanto nos tecidos normais como nos doentes, toda a célula nasce de outra célula.

Tanto Schleiden como Schwann pertenciam a uma escola de pensamento da Alemanha, denominada "Natursphilosophie", que não aceitava a ciência mecanicista da França e da Inglaterra e acreditava que na matéria existiam forças que dirigiam a formação dos seres vivos. Era uma escola que apregoava certo vitalismo, iniciada por Lorenz Oken, com a qual também se identificavam Schelling, Kölliker, Nägeli e Goethe, entre outros.

A teoria celular antecede em apenas quatro anos o livro de Darwin (1859) e tampouco foi imediatamente aceita. Charles Robin, titular da cadeira de Histologia da Faculdade de Medicina de Paris, publicou, em 1873, um tratado de anatomia e fisiologia celular que continuava sustentando a teoria do Citoblastema refutada por Virchow. Auguste Comte, o fundador do positivismo, também posicionou-se contrariamente à teoria celular.


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