Embrapa Trigo

Dezembro, 2004
Passo Fundo, RS

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Informações gerais sobre giberela em trigo e em cevada

- Parte afetada e nomes comuns: a giberela destaca-se entre as doenças que afetam espigas (Fig. 1) e grãos (Fig. 2) de trigo e espigas (Fig. 3) e grãos (Fig.4) de cevada, sendo também conhecida por fusariose.

- Etiologia: a giberela em trigo e em cevada é causada principalmente por Gibberella zeae (Schw.) Petch., cuja forma assexuada é Fusarium graminearum Schw. Pelo menos 17 espécies do mesmo gênero têm sido associadas à enfermidade em cereais em todo o mundo. Além de F. graminearum, as espécies mais relevantes relatadas causando epidemias são Fusarium culmorum, Fusarium nivale, Fusarium avenaceum e Fusarium equiseti. O crescimento característico de F. graminearum em meio de cultura de rotina apresenta cor de rosa (Fig. 5), e os conídios são em formato de meia-lua e têm como característica a célula basal em forma de pé (Fig. 6).

- Importância da doença: a ocorrência tem aumentado nos últimos anos, atingindo níveis epidêmicos em vários países. Causa prejuízos em todas as regiões do mundo onde se cultivam trigo e milho e as condições climáticas são favoráveis ao desenvolvimento da doença. Na região sul da América do Sul, assim como na região sul do Brasil, é considerada problema. No Brasil, em trigo, foi relatada, até recentemente, causando prejuízos esporádicos, como nas safras de 1957, 1975 e 1982. Nos últimos anos, passou a ocorrer em níveis epidêmicos e tornou-se um problema mais preocupante nas safras de trigo no Sul do Brasil, principalmente no estado do Rio Grande do Sul. As epidemias mais recentes de giberela na região sul do Brasil foram registradas em 1997, 1998, 2000 e 2002, anos de elevada precipitação pluvial.

Os prejuízos econômicos, freqüentemente, são subestimados, pois, quando o patógeno afeta as espigas no início da formação de grãos, estes são leves, sendo eliminados na colheita, no processo de trilha, juntamente com a palha. Os danos diretos ocasionados por giberela resultam do abortamento de flores ou da formação de grãos chochos, enrugados, ásperos, de coloração rósea a esbranquiçada (Fig. 2). Os danos indiretos são causados por grãos infeccionados e seus derivados, podendo ser tóxicos tanto para o ser humano como para animais, em razão da presença de micotoxinas, que são substâncias tóxicas produzidas por fungos. Entretanto, somente a presença do grão giberelado não significa que há micotoxinas. Estas, quando presentes, tornam os grãos menos palatáveis aos animais. Algumas toxinas, como a deoxinivalenol (vomitoxina), podem induzir vômitos e espasmos musculares no homem e em animais não ruminantes. Outras micotoxinas podem causar disfunção sexual reprodutiva, como a zearalenona. Tem sido atribuído à presença de elevados níveis de micotoxinas o fenômeno do extravasamento da cerveja ao abrir a garrafa, conhecido também como gushing.

- Condições climáticas favoráveis: a doença giberela é influenciada por condições de ambiente. Precipitação pluvial de, no mínimo, 48 horas consecutivas e temperatura entre 20 e 25 oC são condições ideais para o desenvolvimento da doença. Em períodos mais secos, como anos de ocorrência do fenômeno La Niña na região sul do Brasil, a giberela não é considerada problema em trigo. O mesmo não se verifica em anos de ocorrência de El Niño, em que condições climáticas de temperatura e precipitação pluvial acima da média são extremamente favoráveis à ocorrência da doença. Como giberela pode ocorrer a partir do espigamento, e este, na região sul, ocorre na estação da primavera, pode-se dizer que anos de primavera mais chuvosa e com temperatura mais elevada são anos de epidemia de giberela e anos de primavera fria e mais seca são anos de pouca ocorrência de giberela.

- Aumento de giberela em trigo e em cevada: restos de culturas são as principais reservas de G. zeae, embora solo, sementes e vários hospedeiros suscetíveis também sejam fontes de inóculo. Além de trigo, a giberela tem sido relatada afetando as culturas que fazem parte do sistema de produção da região sul, como cevada, triticale, aveia, centeio e milho, e várias plantas daninhas. G. zeae também foi encontrado em restos culturais de soja. Destaque é dado a milho, pois, além de hospedeiro, os restos culturais (colmos) são importantes para a produção de peritécios de G. zeae (Fig. 7), garantindo assim a sobrevivência do patógeno.

O sistema de manejo conservacionista de solo é inegavelmente eficaz no controle de erosão, que é o objetivo principal da tecnologia, além de ser também fundamental na sustentabilidade da agricultura na região. A mudança do sistema de preparo convencional de solo, caracterizado por revolvimento do solo e incorporação de grande parte dos restos culturais, pelo sistema de manejo conservacionista, na região sul do país, principalmente no Rio Grande do Sul, provavelmente seja um fator importante no aumento da intensidade dos surtos epidêmicos de giberela. A adoção do sistema de manejo conservacionista, em que os restos vegetais das culturas anteriores são mantidos na superfície do solo, dificultando a erosão, em substituição ao sistema convencional, como era de se esperar, poderia causar alterações que implicariam o aparecimento de outros problemas, principalmente em relação a doenças.

É possível sugerir que a giberela seja uma doença favorecida pelo sistema conservacionista de manejo de solo. Os grãos afetados precocemente são mais leves, permanecendo grande parte no campo junto com a palha, na superfície do solo, no processo de trilha. A manutenção de restos culturais na superfície do solo facilita a produção e a disseminação de unidades infectivas (ascosporos) de G. zeae.

- Síntese do ciclo de vida e sobrevivência do patógeno: o patógeno, durante o seu ciclo de vida, apresenta a fase saprofítica e a fase parasitária (Fig. 8). Durante a fase saprofítica, sobrevive na forma teleomórfica, também chamada de sexual, em restos culturais, e recebe o nome de G. zeae, caracterizada pela produção de corpos de frutificação, os peritécios. Na presença do hospedeiro, a partir do espigamento (estádio inicial de suscetibilidade), e sob condições climáticas favoráveis, ocorre a liberação de ascosporos do interior dos peritécios, que, ao atingirem as espigas, germinam, dando início à fase parasitária, que se transforma na fase anamórfica ou assexual, denominada de F. graminearum.

- Principais sintomas e sinais de giberela em trigo: os sintomas característicos são espiguetas despigmentadas, de coloração esbranquiçada ou cor de palha (Fig. 1), que contrastam com o verde normal de espiguetas sadias. Os sintomas iniciais em alguns genótipos, ocasionalmente, podem ser observados pela cor de marrom- escuro na gluma (Fig. 9). Também é considerada sintoma típico de giberela a alteração do sentido das aristas de espiguetas afetadas, que se desviam do sentido das aristas de espiguetas não afetadas (Fig. 1). Em genótipos de trigos múticos (espigas sem aristas) ou com aristas apicais, a giberela é caracterizada pela descoloração de espiguetas (Fig. 10).

Em genótipos muito suscetíveis ou em anos em que as condições de ambiente são muito favoráveis ao desenvolvimento da doença, toda a espiga pode ser afetada, pedúnculo inclusive, que adquire coloração amarronzada (Fig. 11). Quando as primeiras espiguetas afetadas se localizam na porção inferior da espiga, o pedúnculo, geralmente, também apresenta os sintomas de giberela (Fig. 12).

Às vezes, espigas, afetadas por giberela evidenciam sintomas semelhantes aos induzidos por brusone, ou seja, ocorre descoloração de todas as espiguetas da porção superior da espiga (Fig. 13). Nesse caso, o ráquis da espiga afetada por giberela apresenta coloração escura na região de espiguetas sadias (Fig. 14). Os grãos oriundos da parte afetada da espiga apresentam os sintomas típicos de giberela.

Grãos de trigo sadios (Fig. 15) diferem daqueles produzidos em espiguetas atacadas por giberela, em que se formam grãos chochos, enrugados, de coloração branco-rosada a pardo-clara (Fig. 2). O tamanho do grão afetado varia em função do estádio de desenvolvimento em que a espigueta foi infectada pelo patógeno (Fig. 16). Resultado de trabalho realizado na Embrapa Trigo, em 2002, sob inoculação artificial, culminou em alteração nas indicações técnicas da Comissão Sul-brasileira de Pesquisa de Trigo, nas quais, a partir de 2003, passou a constar que, sob condições climáticas favoráveis, a giberela pode afetar a cultura de trigo a partir do espigamento.

Em condições favoráveis, estruturas (sinais) do patógeno são facilmente visualizadas a olho nu. Algumas espiguetas afetadas de espigas ainda verdes apresentam coloração salmão, em decorrência da produção de macroconídios de F. graminearum (Fig. 17). Essa coloração geralmente permanece até o fim do ciclo da planta de trigo. Outros sinais do patógeno também podem ser observados nas espigas secas, pela formação de pontuações escuras, que são os peritécios de G. zeae (Fig. 18).

- Principais sintomas e sinais de giberela em cevada: os sintomas característicos de giberela em cevada são semelhantes aos observados em espigas de trigo, ou seja, espiguetas despigmentadas cor de palha (Fig. 3), que contrastam com o verde normal de espiguetas sadias. As aristas das espiguetas afetadas também são despigmentadas, porém raramente há desvio de sentido, em relação ao das aristas de espiguetas sadias, como se verifica em trigo. A infecção geralmente ocorre em mais de um local na espiga, apresentando distribuição pontual, não sendo comum a evolução dos sintomas por toda a espiga. Os sintomas iniciais, em alguns genótipos, podem ser observados pela cor de marrom-escuro na gluma e, nesse caso, posteriormente, a arista torna-se despigmentada (Fig. 19). Os sintomas podem se manifestar na bainha das espigas (Fig. 20), quando, por algum motivo, não ocorre o espigamento normal e as espigas encontram-se parcialmente retidas e protegidas pela bainha. Nesse caso, ao se remover a bainha, geralmente, toda a espiga apresenta-se afetada (Fig. 21).

Em condições favoráveis, estruturas do patógeno podem ser produzidas. Algumas espiguetas afetadas de espigas ainda verdes apresentam coloração salmão, em decorrência da produção de macroconídios de F. graminearum (Fig. 22). Essa coloração geralmente permanece até o fim do ciclo da planta de cevada. Micélio do patógeno de cor branca pode ser observado internamente nas espigas retidas nas bainhas (Fig. 21). Outra estrutura do patógeno pode se desenvolver na superfície dos grãos colhidos, pela formação de pontuações escuras, que são os peritécios do patógeno (Fig. 4).

Os grãos provenientes das espiguetas afetadas são geralmente mais finos, em relação aos sadios, e podem apresentar, parcialmente, a cor de rosa (Fig. 4).

 


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