Agosto, 2012
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Passo Fundo, RS
Aspectos econômicos e conjunturais da cultura da aveia
Cláudia De Mori1
Renato Serena Fontaneli1
Henrique Pereira dos Santos1
Introdução

A aveia é uma gramínea anual pertencente a família Poaceae, tribo Aveneae e gênero Avena. Tal gênero compreende várias espécies silvestres, daninhas e cultivadas distribuídas em seis continentes (GUTKOSKI e PEDÓ, 2000). As principais espécies cultivadas no país são a aveia branca (Avena sativa L.), a aveia amarela (Avena byzantina C. Koch), espécies de duplo propósito com produção de forragem e grãos, e a aveia preta (Avena strigosa Schreb) empregada como pastagem, de forma isolada ou em consorciação com outras forrageiras, e como adubo verde (FLOSS, 1988; MATZENBACHER, 1999). Formas silvestres como a Avena fatua L., Avena barbata Pott ex-link e Avena sterilis L., também são encontradas (FLOSS, 1988). Em função de cruzamentos entre aveias branca e amarela, pelos programas de melhoramento genético e dificuldade de separação das espécies, adota-se o nome de aveia branca para todas as cultivares indicadas pela Comissão Brasileira de Pesquisa de Aveia para produção de grãos e de duplo propósito. Assim, há comercialmente apenas duas espécies Avena sativa e Avena strigosa (REUNIÃO...., 2012).

Embora existam controvérsias, Coffman (1977) sugere que o centro de origem das espécies silvestres haploides A. sterilis e A. fatua, progenitores das aveias cultivadas, seja a região da Ásia Menor. Aparentemente, a Avena sativa teve origem na Ásia, enquanto as Avena byzantina e Avena sterilis, no Mediterrâneo e Oriente Médio (MUNDSTOCK, 1983). Uma das primeiras referências sobre consumo de aveia pela humanidade é o das tribos germânicas no século I (WEBSTER, 1986 apud GUTKOSKI e PEDÓ 2000), mas na Irlanda e Escócia, a aveia encontrou maior aceitação sendo usada em uma variedade de mingaus (GUTKOSKI e PEDÓ 2000). A aveia já estava extensivamente estabelecida na Europa Ocidental no final do século XVII para a produção de grãos e de forragens, mas um novo sistema de agricultura pautado na aveia como componente de rotação de culturas e utilização no arraçoamento de cavalos desenvolvido na Europa do Norte, entre os anos de 1000 e 1500, e a relação estabelecida entre aveia e alimentação de cavalos influenciou decisivamente sua expansão no período em que o animal serviu como principal meio de tração (COFFMAN, 1977).

A época de introdução da aveia no Brasil não está determinada. Segundo Hendry e Kelly (1925, apud COFFMAN, 1977), foram os espanhóis que introduziram a cultura da aveia na América, provavelmente Avena byzantina. Mais tarde, a Avena sativa e a Avena strigosa foram introduzidas no Cone Sul do Continente (MUNDSTOCK, 1983). O Brasil apresenta registro de cultivo de aveia desde o século XV. Beckman (1943 apud FLOSS et al. 1993) relata atividades fracassadas de introdução de inúmeras cultivares de aveia importadas de várias partes do mundo, em especial, devido a doenças como a ferrugem da folha. A área da cultura tem se concentrado na região sul do país, com registros de cultivo no Mato Grosso do Sul, a partir da década de 1980, e registros esporádicos em estados como Bahia, Minas Gerais, São Paulo, Goiás, Distrito Federal e Mato Grosso.

O cereal possui múltiplas formas de utilização: produção de grãos para consumo humano; matéria prima industrial para a produção de cosmético e insumos para indústria química; consumo animal de grãos ou para formação de pastagens de inverno para pastejo e/ou elaboração de feno e de silagem e cobertura de solo e adubação verde com vistas a implantação das culturas de verão, em sucessão. O uso na alimentação animal constitui seu maior uso no Brasil e no mundo. Quando empregada em forma de ração, a maior demanda é para uso na alimentação de cavalos de corrida. Na alimentação humana, o cereal tem sido empregado na produção de alimentos infantis, cereais matinais (quentes ou frios), granola, muslins, barra de cereais, produtos forneados ou assados (pães, biscoitos, bolos, etc.), componente adicional para engrossar sopas, molhos e para aumentar o volume de produtos cárneos. Além de produtos cosméticos, fármacos, enzimas, segundo Shukla (1975), citado por Gutkoski e Pedó, 2000, outros usos industriais de aveia são antioxidante e estabilizante em gelados e outros produtos lácteos; uso de cascas de aveia como matéria-prima para a fermentação de furfural, um solvente químico utilizado na refinação de minerais e para elaboração de resina; e produção de adesivos.

Os benefícios atribuídos à fibra solúvel da aveia na redução de colesterol no sangue e como alimento funcional tem ampliado o interesse pelo consumo do cereal e incrementado a oferta de produtos, como cereais matinais, barras de cereais, produtos forneados a base de aveia e lácteos com adição de fibra de aveia. Um exemplo da ampliação do uso do produto é o leite UHT que mistura óleo de palma e aveia, ao qual é atribuída função de auxiliar o sistema gastrointestinal e no emagrecimento. Segundo Webster (1986 apud GUTKOSKI e PEDÓ 2000), a aveia destaca-se dentre os outros cereais por seu teor e qualidade proteica, variando de 12,40 a 24,50% no grão descascado; e por sua maior porcentagem de lipídios, que varia de 3,10 a 10,90%, distribuídos por todo o grão e com predominância de ácidos graxos insaturados. O cereal também se destaca por seu teor de fibras alimentares e, principalmente, pela concentração de beta-glucanas, componentes estruturais das paredes celulares dos cereais, que atuam na redução do colesterol em indivíduos com hipercolesterolemia, conforme demonstrado por estudos clínicos sobre os efeitos de aveia e farelo de aveia na redução do colesterol sérico e na consequente diminuição dos riscos de doenças coronárias (FDA, 1997). Além dos efeitos sobre o colesterol, o consumo de aveia pode diminuir a absorção de glicose, o que é benéfico para diabéticos, e pode estimular funções imunológicas, tanto in vitro quanto in vivo (SÁ et al., 2000).

O consumo alimentar da aveia no Brasil é baixo, no entanto, apresenta tendência de aumento. Segundo os dados da Pesquisa de Orçamento Familiar (IBGE, 2012a), a aquisição domiciliar de flocos de aveia passou de 0,032 Kg/habitante/ano, em 2002, para 0,074 Kg/habitante/ano, em 2008 (Tabela 1). As regiões nordeste e norte apresentaram os maiores valores de aquisição e a região centro-oeste, os menores valores, considerando os dois anos de pesquisa.

O número de indústrias de processamento de grãos de aveia para uso humano no Brasil aumentou a partir de 1994 com a instalação de quatro novas indústrias (Cotrijuí em Ijuí/RS, Cerealista Campo e Lavoura Ltda em Ajuricaba/RS, Antônio Carlos Dolzan em Lagoa Vermelha/RS e SL Alimentos em Mauá da Serra, PR), além das já existentes (Quaker Ltda em Porto Alegre, RS, Corsetti S.A. em Caxias do Sul, RS e Ferla em São Paulo) (GUTKOSKI e PEDÓ, 2000). Atualmente, há um grande número de empresas processadoras de alimentos naturais ou que contemplam aveia na formulação de seus produtos. As principais empresas de processamento de grãos para emprego humano são SL Alimentos, Ferla e Pepsico (Quaker Oats).


1 Eng. Agrôn., Pesquisador da Embrapa Trigo. Cx. Postal 451, 99001-970 Passo Fundo, RS. E-mail: cdmori@cnpt.embrapa.br.

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