MAPA
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ISSN 1517-4964
Dezembro, 2008
Passo Fundo, RS

Imagem: Paulo Pereira
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Aspectos populacionais de percevejos fitófagos ocorrendo na cultura da soja (Hemiptera: Pentatomidae) em duas áreas do norte do Rio Grande do Sul

Paulo Roberto Valle da Silva Pereira1, José Roberto Salvadori1

Introdução

A produção de grãos através de rotação e sucessão de culturas, muitas vezes integradas a sistemas pecuários, é de extrema importância para uma agricultura sustentável tanto do ponto de vista ambiental como sócio-econômico. Entretanto, se por um lado essa diversificação do sistema é benéfica, por outro, possibilita o cultivo sucessivo, a exploração intensa das áreas, com o uso crescente de inseticidas químicos. Estes fatores têm desencadeado o crescimento populacional de algumas espécies de percevejos, considerados anteriormente pragas secundárias (PANIZZI, 1997). Áreas cultivadas durante o ano todo fornecem condições ideais para a sobrevivência de percevejos polífagos, cuja população pode aumentar a ponto de causar danos significativos em diversas culturas (CHOCOROSQUI, 2001).

Os pentatomídeos, popularmente conhecidos por percevejos, são principalmente sugadores de sementes e atacam plantas durante o período reprodutivo, possuindo importância econômica em diversas regiões produtoras de grãos (CHOCOROSQUI & PANIZZI, 2004). Pelo menos 15 espécies de percevejos da família Pentatomidae são registradas como sugadores, sendo que as espécies Nezara viridula (L.), Piezodorus guildinii (Westwood) e Euschistus heros (Fabricius) são as mais importantes do complexo de percevejos pragas da soja (PANIZZI & ROSSI, 1991).

Apesar da vasta literatura para percevejos na soja, muitos aspectos bioecológicos ainda não são totalmente conhecidos, principalmente no que diz respeito às suas interações com outras espécies vegetais integrantes do agroecossistema de produção de soja, seu comportamento e localização na ausência do hospedeiro principal (soja) durante o inverno, os principais fatores de mortalidade natural dos percevejos nas diferentes regiões e a flutuação e predominância de espécies nas diferentes regiões produtoras. Também tem sido observado aumento populacional e dificuldades de controle de diversas espécies de percevejos da soja nas últimas safras (ALVES, 2000; GOMEZ & ÁVILA, 2003). Além disso, os percevejos, incluindo Nezara viridula e Euschistus heros estão também associadas ao milho causando danos semelhantes aos de Dichelops melacanthus. Estes percevejos têm aumentado sua população a cada ano, com ocorrência em todas as épocas de plantio de milho, requerendo, muitas vezes, tratamento com inseticidas nas sementes e pulverizações foliares para redução de danos (PANIZZI, 2000). Embora sementes e frutos imaturos sejam as estruturas preferidas para alimentação por estes percevejos, em gramíneas, principalmente no estágio de plântula, o colmo, na região próxima ao solo, também é bastante visado. Os sintomas dos danos ocasionados pela alimentação dos percevejos fitófagos são resultados da combinação de vários fatores: injúria mecânica, injúria química, desbalanceamento hormonal (auxinas, conseqüência tanto da injúria mecânica como da química) e a ativação do sistema fenol-fenoloxidase da planta. Este último é uma reação de defesa da planta ao dano de alimentação e que, em alguns casos, pode resultar na produção de substâncias tóxicas para as células vegetais (reações de hipersensibilidade), gerando, desta maneira, deformações nas plantas ou estruturas atacadas.

Este trabalho tem por objetivo fornecer informações sobre a predominância das espécies de percevejos fitófagos em duas regiões de produção de soja, como forma de auxílio para o manejo destes insetos em uma escala regional.

Material e métodos

As amostragens de percevejos foram realizadas em dois locais da região norte do estado do Rio Grande do Sul, nos municípios de Sertão (S -28o 02' 49,721''; O -52o 15' 20,207'' / altitude média de 705 m) e Vacaria (S -28o 25' 00,469''; O -50o 59' 28,918'' / altitude média de 919 m). Em cada local foram realizadas duas coletas. Em Sertão as datas foram 27/03/2007 e 11/04/2007 e em Vacaria 04/04/2007 e 18/04/2007. Nas duas localidades, o estádio de desenvolvimento da soja no momento das coletas foi R5, de acordo com a escala de FEHR & CAVINESS (1977). O processo de amostragem foi realizado por meio de pano de batida (1 m x 1m), colocado entre as fileiras de soja, com um lado na base das plantas e o outro estendido sobre as plantas de soja da fileira adjacente (CORRÊA-FERREIRA, 2005). As plantas de 1 m de fileira foram inclinadas e batidas sobre o pano, sendo realizada a coleta dos percevejos presentes, para posterior contagem em laboratório dos adultos e ninfas (3º ao 5º instar). Os pontos de coleta das amostras com o pano de batida, dentro de cada local e data, foram escolhidos aleatoriamente, sendo o número de pontos amostrados o seguinte: Sertão (27/03/2007) = 99 pontos; Sertão (11/04/2007) = 101 pontos; Vacaria (04/04/2007) = 109 pontos; Vacaria (18/04/2007) = 105 pontos (Fig. 1 e 2).

Resultados

As amostragens de percevejos em Sertão e em Vacaria, indicaram que nas duas localidades as espécies encontradas foram as mesmas - Nezara viridula, Euschistus heros, Piezodorus guildini, Dichelops furcatus e Edessa meditabunda. Entretanto, na localidade de Sertão a espécie predominante foi o percevejo-marrom E. heros, enquanto que na localidade de Vacaria a espécie predominante foi o percevejo-verde N. viridula (Tabela 1). Esta diferença na predominância pode estar relacionada com a diferença de altitude entre os dois locais amostrados. Esta hipótese pode ser confirmada por Panizzi & Corrêa-Ferreira (1997) que citam que o N. viridula é mais bem adaptado a regiões de clima ameno, como é o caso de Vacaria em relação a Sertão.

A Fig. 3 mostra a participação percentual das diferentes espécies de percevejos fitófagos amostradas em lavoura de soja na localidade de Sertão, onde se observa a predominância de E. heros na população de percevejos fitófagos, com 75,4% de participação média nas duas coletas, seguido por D. furcatus com 8,4%, P. guildinii com 8,1%, N. viridula com 6,7% e E. meditabunda com 1,3%.

A Fig. 4 mostra a participação percentual das diferentes espécies de percevejo amostradas em lavoura de soja na localidade de Vacaria, onde se observa a evidente predominância de N. viridula na população de percevejos fitófagos, com 91,3% de participação média nas duas coletas, seguido por D. furcatus com 4,8%, P. guildinii com 2,1%, além de E. meditabunda e E. heros que não atingiram 1,0% de participação.

As diferenças observadas na população de percevejos fitófagos entre as duas localidades onde foram realizadas as amostragens constituem-se em informação importante para o conhecimento da flutuação populacional de percevejos em uma escala regional, para evidenciar a necessidade da prática da amostragem e também para o manejo deste grupo de insetos-praga, uma vez que existem variações na intensidade de dano que cada espécie causa aos grãos de soja. Segundo Corrêa-Ferreira & Azevedo (2002), que estudaram as três principais espécies de percevejos da soja, P. guildini é a espécie com maior potencial de dano qualitativo ao grão de soja, quando comparada com N. viridula e E. heros, que é a espécie com o menor potencial de dano. Para D. furcatus e E. meditabunda, até o momento as informações existentes não enquadram estes percevejos como daninhos à soja.

A Tabela 2 mostra que o número médio de percevejos coletados em Sertão e Vacaria foi superior ao nível de ação recomendado (1 percevejo/m) para a fase de enchimento de grãos, indicando assim a necessidade de adoção de medidas de controle, utilizando-se, quando necessário, produtos seletivos que possibilitem a sobrevivência e permanência de inimigos naturais na lavoura (CORRÊA-FERREIRA, 2005).

A amostragem de percevejos fitófagos na soja, por meio do pano de batida, é prática importante para o correto manejo deste grupo de insetos, uma vez que apenas a inspeção visual da área, geralmente subestima a população real de percevejos, retardando assim, a entrada com medidas de controle e aumentando a probabilidade de perdas em rendimento e em qualidade de grãos.


1 Pesquisador da Embrapa Trigo. Caixa Posta 451, CEP 99001-970 - Passo Fundo,RS. E-mail: paulo@cnpt.embrapa.br; jrsalva@cnpt.embrapa.br.


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