Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento

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ISSN 1517-4964
Junho, 2007
Passo Fundo, RS

Foto: Alfredo do Nascimento Junior
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O uso de centeio como cultura intercalar em videiras

Alfredo do Nascimento Junior1, Mauro César Celaro Teixeira1, Vânia Bianchin2, Letícia Lazzari Rigo3, Maurício Tonello4, Rafaela de Moura5

O cultivo de uva (Vitis vinifera L.) na tradicional e principal região produtora no Rio Grande do Sul é realizado principalmente por pequenos produtores com o uso predominante de mão-de-obra familiar e em propriedades de topografia acidentada, com no máximo quinze hectares, sendo destinados em média 2,5 hectares para vinhedos (Mello & Protas, 2003).

Após a implantação da cultura são exigidas diversas operações de modo a obter as melhores condições para expressão da máxima produtividade, como adubação, poda, formação de plantas, tratamentos fitossanitários, manejo da vegetação entre linhas, colheita, etc.

Normalmente os solos destinados para esse cultivo são aqueles menos adequados às culturas anuais como o milho, o feijão, o trigo, por serem ácidos, intemperizados, erodidos, com elevada degradação das características químicas, físicas e biológicas e apresentarem reduzida capacidade de infiltração de água e com elevada infestação de ervas daninhas.

As plantas daninhas competem com a cultura pelos recursos ambientais, principalmente água e nutrientes. Além disso, podem causar redução da rentabilidade, por exigirem capinas manuais e/ou uso de tratamentos herbicidas que despendem, além do tempo, elevado custo em produtos químicos e aplicações. Vargas & Oliveira (2005) evidenciaram a importância do manejo e dos distintos métodos de controle de plantas daninhas, como o uso de cobertura morta e de plantas de cobertura, para a redução da infestação de invasoras.

Wutke et al. (2005) afirmaram que estudos com a utilização de coberturas mortas e verdes em sistemas de produção de uvas são quase que inexistentes no Brasil. Os mesmos autores concluíram que a cobertura morta de Brachiaria decumbens, nas ruas do parreiral pode ser substituída pelo cultivo de plantas para cobertura verde no outono-inverno e na primavera-verão, sem alteração prejudicial nas características comerciais de qualidade em frutos de videira ‘Niagara Rosada’.

Informações obtidas com produtores de sementes de centeio (Secale cereale) destacam essa espécie como excelente planta de cobertura como cultura intercalar para vinhedos, sendo que a procura por sementes para essa finalidade aumenta a cada ano (informação pessoal do autor). Outras espécies de plantas também são utilizadas, no outono-inverno, como a aveia preta (Avena strigosa), a ervilhaca (Vicia sativa), o azevém anual (Lolium multiflorum), entre várias, para cultivo solteiro ou consorciadas.

O centeio tem elevada adaptação ao clima do Rio Grande do Sul, produzindo palhada em grande quantidade, por ser planta rústica e altamente tolerante a condições adversas de cultivo, impedindo o desenvolvimento de plantas daninhas durante o ciclo, mantendo efeito após a colheita através da palhada restante sobre o solo. O centeio produz determinados componentes alelopáticos nos tecidos da planta e em exsudados das raízes que inibem a germinação e o crescimento de espécies daninhas e de outras culturas. Esses efeitos alelopáticos, associados à habilidade competitiva, fazem do centeio uma alternativa atrativa no manejo de plantas daninhas de modo geral (Vargas & Roman, 2005).

Com o objetivo de avaliar o uso do centeio como cultura intercalar em sistema de cultivo de uva com cobertura de solo e com controle de ervas daninhas, este trabalho foi conduzido em uma unidade de observação em área de produtor rural, na localidade de São José do Ouro – RS.

Material e Métodos

Foi implantada unidade de observação de centeio para cobertura de solo em sistema de produção de uva da cultivar “Isabel”, destinada à produção de vinho na propriedade do Sr. Adão Bianchin, em linha Bianchin, São José do Ouro – RS, localizada na latitude de 27º46’ S e na longitude de 51º35’ W, com altitude de 775 metros.
Foi utilizada a cultivar de centeio BRS Serrano, desenvolvida pela Embrapa Trigo. A semeadura foi realizada a lanço no dia 20 de maio de 2006, sendo em seguida incorporada através de pequeno revolvimento da camada superficial do solo com o uso de enxada, em área de 60 metros quadrados, estando a videira em dormência vegetativa.
A densidade de semeadura foi de aproximadamente 250 sementes aptas por metro quadrado. Não foi realizada, para esse cultivo, adubação na semeadura e de cobertura, sendo somente aproveitados os resíduos da adubação para a videira. Do mesmo modo, não foi realizado controle químico de ervas daninhas na unidade de observação de centeio. No restante da área, entretanto, foi realizada uma aplicação de glifosate na dosagem de 720 g/ha de equivalente ácido, com pulverizador costal manual, em jato dirigido, no dia 17 de setembro.

Em 30 de setembro, 120 dias após a semeadura, durante o enchimento de grãos, foi realizado o tombamento das plantas do centeio através de pisoteio. Nesse momento, as plantas das videiras estavam com a brotação iniciada, e o processo de poda verde e desbrota estava preste a ser iniciado (figuras 1 e 2).

A avaliação da infestação de plantas daninhas foi realizada através de amostragem na área cultivada com centeio e em área contígua a esta representativa da área de cultivo da videira, com três sub-amostras cada. A amostragem foi realizada digitalizando imagem da área de 0,25m2 da superfície do solo para cada sub-amostra. As imagens foram analisadas pelo software “Sigma Scan-Pro 5.0” a fim de comparar a área coberta por plantas daninhas na superfície, com a testemunha, considerando a área do produtor sem o cultivo de centeio.

Resultados e discussão

Na área testemunha a vegetação espontânea era composta, predominante, por desmódio (Desmodium purpureum), picão branco (Galinsoga parviflora), picão preto (Bidens pilosa; B. subalternans), caruru (Amaranthus spp.), guanxuma (Sida spp.), leiteiro (Euphorbia heterophylla), papuã (Brachiaria plantaginea), tiririca (Cyperus rotundus) e maria-gorda (Talinum paniculatum), sendo que 90% das plantas infestantes eram das três primeiras espécies.

Pode ser observado nas figuras 3, 4 e 5 da área testemunha que a infestação de plantas daninhas foi elevada, cobrindo quase a totalidade da superfície do solo mesmo após tratamento para dessecação com glifosate 45 dias antes, sendo que as porcentagens da área de superfície coberta por plantas daninhas foram de 74,5%; 87,8% e 87,8 %, respectivamente.

No entanto, considerando o tratamento com cobertura de centeio, foi obtida a supressão da totalidade de plantas daninhas. Em média, apenas 3,2 % da área da sub-amostra apresentaram infestação de plantas daninhas (figuras 6, 7 e 8). As porcentagens de área de superfície coberta por plantas daninhas foram de respectivamente, 3,4%; 2,6% e 3,6%, respectivamente, resultando em decréscimo de 80% de infestantes, em média em relação à testemunha.

Deve ser considerado que no momento dessa avaliação a videira estava na fase de alongamento celular da baga, ou seja, anterior ao amadurecimento (figura 9), devendo ainda permanecer no campo por mais 80 a 90 dias até a colheita. No período restante, considerando as espécies de plantas daninhas infestantes, deverão ser realizadas pelo menos uma roçada e uma aplicação de herbicida na área testemunha até a colheita dos cachos de uvas, não sendo necessária essa operação na área com centeio.

As operações de controle de plantas daninhas, pelas dessecações e roçadas, demandam tempo e custos adicionais, recursos que poderiam ser aproveitados pelo produtor rural em outras atividades.

A cobertura vegetal proporcionada pela palhada de centeio, além de controlar o desenvolvimento de plantas daninhas, evita em grande parte o efeito prejudicial do impacto de gotas d’água, diminui o escorrimento superficial da água no solo por excesso de chuvas, aumenta a infiltração de água no perfil do solo e com o tempo disponibilizará uma melhor estrutura química, física e biológica do solo pela reciclagem e adição de nutrientes que poderão resultar em maior produtividade e rentabilidade na produção das videiras.

Conclusão

O cultivo de centeio entre linhas em sistemas de produção de uvas foi eficiente como cobertura morta no solo e para o controle de plantas daninhas.


1 Pesquisador da Embrapa Trigo, Caixa Postal 451, CEP 99001-970 Passo Fundo, RS. E-mail do autor para correspondência: alfredo@cnpt.embrapa.br.
2 Aluno do Curso de Pós-Graduação em Agronomia da Universidade de Passo Fundo - UPF, bolsista CAPES.
3 Estudante de Agronomia da Universidade de Passo Fundo - UPF, Estagiário da Embrapa Trigo, bolsista Iniciação Científica CNPq.
4 Estudante de Agronomia da Universidade de Passo Fundo - UPF, Estagiário da Embrapa Trigo, bolsista PROUNI.
5 Estudante de Biologia da Universidade de Passo Fundo - UPF, bolsista Iniciação Científica da Embrapa.

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