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Dezembro, 2003
Passo Fundo, RS

Introdução

O interesse em maximizar o rendimento de trigo tem estimulado o uso de um manejo intensivo nessa cultura. Esse manejo integra a adoção de determinadas práticas, como época de semeadura, espaçamento e densidade de sementes adequados, aumento do nível de fertilidade do solo e controle de doenças, de insetos e de acamamento de plantas.

Nas condições climáticas do Sul do Brasil, o acamamento é um dos fatores que pode limitar a produção de grãos de trigo de modo expressivo, dependendo da intensidade e do estádio de desenvolvimento da planta em que ocorre. Nesse aspecto, a antese parece ser o estádio mais sensível. Tais limitações de maximização do rendimento de grãos por acamamento podem ser decorrentes de alta competição por luz pelas plantas (alta densidade de plantas), de desbalanço de nutrientes (suplemento excessivo de nitrogênio-Box 1), de decréscimo da fotossíntese, de redução na assimilação e translocação de carboidratos e minerais, de aumento da intensidade de doenças e de redução na eficiência da colheita.

De modo geral, o acamamento tem sido normalmente controlado mediante restrição da aplicação de fertilizantes nitrogenados e uso de cultivares de trigo de porte baixo. No RS, a adoção de cultivar de porte baixo (por exemplo, padrão BR 23) já atingiu mais de 50% da área de cultivo, constituindo fator importante de redução de perdas por acamamento na cultura de trigo, em passado recente. Contudo, essa situação não refletia toda a região tritícola do Sul do Brasil, onde a maioria das cultivares recomendadas na época eram de porte alto e, dependendo das condições de cultivo e de ambiente, apresentavam sensibilidade ao acamamento. Tal situação, nos últimos anos, intensificou-se ainda mais. Além disso, o emprego de reguladores de crescimento em trigo não constitui prática de manejo usada no Sul do Brasil. O uso mais  generalizado de regulador de crescimento tem sido observado em países europeus como prática para melhor explorar a capacidade produtiva de alguns sistemas de produção de cereais.

Vários reguladores de crescimento têm sido usados em cereais, entre os quais destacam-se o cloreto de 2-cloro etil trimetilamônia, conhecido como "CCC", recomendado para a cultura de trigo na década de 1960, e Ethephon (2-cloro-etil ácido fosfônico), recomendado para a cultura de cevada na década de 1970. O Cycocel (CCC) tem sido mais usado em trigo, caracterizando-se pelo seu efeito em estímulo ao afilhamento, redistribuição de biomassa com aumento do crescimento de raízes, redução de estatura e fortalecimento de colmos, o que restringe os riscos das plantas ao acamamento. Recentemente (2002), foi lançado no mercado o Moddus (Trinexapac-etil), um regulador com forte ação na inibição da elongação dos entrenós, o que reduz a estatura da planta e evita, dessa forma, o acamamento e perdas na produtividade associadas a esse fenômento. Entre esses reguladores, desde o início da década de 1960, têm-se acumulado informações do efeito de "CCC" na prevenção ou redução do acamamento e conseqüente redução de perdas por colheita. O principal sucesso desse regulador de crescimento tem sido obtido em trigo, cultura na qual apresenta uso difundido em escala comercial em muitos países, especialmente sob condições de boa fertilidade, em que altos rendimentos de grãos são obtidos.

Os reguladores de crescimento atuam como sinalizadores químicos na regulação do crescimento e desenvolvimento de plantas. Normalmente ligam-se a receptores na planta e desencadeiam uma série de mudanças celulares, as quais podem afetar a iniciação ou modificação do desenvolvimento de órgãos ou tecidos. Os reguladores que reduzem a estatura de plantas são normalmente antagonistas às giberelinas e agem modificando o metabolismo destas.

 

Aumento do rendimento de grãos

Estudos de avaliação do potencial de produção de grãos de trigo, desenvolvidos na Embrapa Trigo, revelaram que o número de grãos/m2 foi o componente que esteve significativamente mais associado ao avanço do rendimento de grãos de trigo, nos últimos 50 anos. O melhoramento do potencial genético, dessa forma, esteve relacionado com o maior número de grãos (maior número de drenos). Essa alta associação também tem sido observada em outros estudos na Argentina, no México, nos Estados Unidos da América, na Inglaterra, entre outros. Assim, o melhoramento genético para produção de grãos esteve associado a mudanças nos atributos fisiológicos de pré-antese nas cultivares modernas de trigo. Com relação ao peso de grãos, não se observou associação significativa com rendimento de grãos nas cultivares estudadas durante o período citado. Essa forte associação entre número de grãos por área e rendimento de grãos está indicando que o fornecimento de assimilados para o crescimento de grãos, produzidos pelo sistema fotossintético da cultura (fonte) em conjunto com as reservas acumuladas em órgãos vegetativos em pré-antese, é suficiente para satisfazer a demanda de grãos em crescimento (capacidade dos destinos).

O rendimento de grãos em trigo pode ser estimado pelo seus componentes, os quais, por sua vez, são definidos em pré-antese (número de espigas/m2 e número de grãos/espigas) e em pós-antese (peso de grãos). A interpretação do rendimento de grãos por meio dos seus componentes é difícil, principalmente em razão da existência de compensação entre os componentes durante o desenvolvimento da cultura. Assim, cuidados devem ser tomados em estudos sobre o efeito de reguladores de crescimento nos componentes de rendimento, principalmente quando se consideram o acamamento como efeito principal e a época de ocorrência. Ainda, nesses estudos, deve-se manejar a cultura de forma adequada e, assim, reduzir os efeitos compensatórios entre os componentes de rendimento.

Embora alguns autores tenham observado efeito do "CCC" no aumento de rendimento de grãos em trigo por meio do incremento em componentes de rendimento, em estudos realizados na Embrapa Trigo empregando várias cultivares de trigo, submetidas a várias doses de redutor de crescimento (CCC), não se observou efeito significativo com relação aos componentes de rendimento definidos no período de pré-antese, como número de espigas/m2 e número de grãos por espiga (tabelas 1 e 2).

Com relação ao peso de grãos, definido após a antese, da mesma forma, não foram observadas diferenças significativas entre os tratamentos com e sem aplicação de redutor de crescimento (CCC-Cycocel) (Tabela 3).

Considerando a não alteração nos componentes de rendimento (tabelas 1, 2 e 3) com aplicação de Cycocel, o aumento no rendimento de grãos verificado na média das cultivares (Tabela 4) com a aplicação de Cycocel pode ser decorrente do efeito do produto na redução do acamamento e, conseqüentemente, na diminuição de perdas na colheita. Nesses casos, podem-se evitar perdas significativas no rendimento de grãos com aplicação de CCC, em comparação com trigo acamado. Ademais, com a cultivar BR 23 (porte baixo), em que pese o acamamento não ter ocorrido, a aplicação do redutor de crescimento provocou aumento do rendimento de grãos. A causa desse efeito permanece desconhecida e requer mais estudos para sua determinação.

Resultados recentes de resistência ao acamamento, relativos à avaliação do efeito do regulador de crescimento Moddus em várias doses de aplicação na cultivar de trigo CEP 27, são apresentados na Tabela 5. Neste estudo, chuvas e ventos fortes durante o ciclo da cultura foram responsáveis pelo acamamento, principalmente nos tratamentos que não receberam o redutor de crescimento. A análise do efeito do redutor de crescimento para cada dose de N aplicada revelou que o grau de prevenção de acamamento foi dependente da dose de Moddus e da dose de N aplicadas em cobertura. Assim como observado por outros autores que estudaram o efeito de redutores de crescimento na cultura de trigo, as doses de N mais elevadas causaram maior acamamento da cultura, enquanto as maiores doses de Moddus causaram as maiores reduções desse fenômeno. Na dose de 45 kg de N/ha, a adição de 0,4 l/ha de Moddus controlou em 100% o problema de acamamento. Ademais, foi necessário 0,5 l/ha de Moddus para a obtenção do mesmo controle de acamamento em trigo, quando a adubação nitrogenada foi de 135 kg de N/ha.

Com relação ao rendimento de grãos, o produto testado (Moddus) mostrou-se seletivo à cultura de trigo, não havendo prejuízo na produtividade da cultura. Houve efeito positivo significante do redutor de crescimento na produtividade de trigo, provavelmente como resultado do controle de acamamento, pela redução do porte da cultura. Todos os tratamentos foram significativamente superiores à testemunha (Tabela 6).

 

Quando usar

O efeito do redutor de crescimento (p.ex., Cycocel, Moddus) depende de diversos fatores, como dose usada, época de aplicação, época de semeadura, condições de ambiente, estado nutricional e fitossanitário da cultura. Além desses fatores, o risco de acamamento, associado a boas perspectivas de rendimento de grãos da cultura, deve orientar a decisão de se aplicar o produto. Se os riscos de acamamento são reduzidos, e as condições acima não são apropriadas para altos rendimentos de grãos, o uso de redutor apenas aumentaria o custo de produção da cultura.

 

Época de aplicação

A aplicação de regulador de crescimento, como prática de manejo para reduzir os riscos de acamamento em trigo, deve ser dirigida no sentido de potencializar sua ação na redução do crescimento da planta.

A resistência ao acamamento é função direta do nível de espessamento dos tecidos da base da planta e inversamente proporcional à estatura desta. Assim, aplicações em estádios de crescimento anteriores ao recomendado provocam efeito pequeno na estatura de planta, pois o efeito redutor vai ocorrer principalmente nos primeiros entrenós, que, por natureza, já são curtos. Além disso, aplicações tardias reduzem sensivelmente o tamanho das plantas, pois o efeito maior ocorre sobre os entrenós superiores, que são longos (pedúnculo), em detrimento do engrossamento da base da planta. A redução excessiva do colmo e o retardamento do espigamento são conseqüências da aplicação tardia e podem, dependendo das condições, provocar prejuízos no rendimento de grãos.

Dessa forma, para aplicações mais eficientes de redutores de crescimento em trigo, torna-se imprescindível a identificação correta do estádio de desenvolvimento da planta-alvo, independentemente do tempo cronológico (dias), uma vez que a duração desse estádio é controlada por vários fatores (temperatura, vernalização, fotoperíodo, características genéticas do germoplasma, disponibilidade hídrica etc.). Assim, para diferentes cultivares (Fig. 1), com exigências termofotoperiódicas diferentes, e mesmo para uma única cultivar, mas semeada em épocas diferentes (Fig. 2), o período ideal (estádio) varia no tempo. Dessa forma, a aplicação de redutores de crescimento com base no tempo calendário (dias) implica grande probabilidade de atingir as plantas fora do estádio ideal. Assim, grande atenção deve ser dada ao momento da aplicação, para o qual se recomenda o estádio F-6 (primeiro nó visível – Fig. 1 e 2 ) da escala de Feeks-Large, ao se usar CCC, e entre os estádios de primeiro e segundo nó visível, no uso de Moddus. Nesses estádios, tanto o colmo é encurtado como sua base é engrossada, conferindo, assim, maior resistência ao acamamento.

Com relação ao efeito de regulador de crescimento na estatura de plantas de trigo, constatou-se que a aplicação de 2 l/ha de Cycocel reduziu significativamente a estatura de planta nas cultivares estudadas (Tabela 7) e não foram observadas diferenças significativas entre as doses de 2, 4 e 8 l/ha. Da mesma forma, quando se testou o redutor de crescimento Moddus, houve diferenças significativas na estatura de plantas com aplicação. A redução na altura foi maior, estatisticamente, na dose de 0,5 l/ha de Moddus, sendo similar, em termos absolutos, quando se usaram doses mais elevadas de nitrogênio em cobertura (Tabela 8).

Com relação ao encurtamento dos entrenós, nas doses acima estudadas, observou-se efeito diferenciado de Cycocel em função das cultivares. A cultivar BR 23, de porte baixo, apresentou menor comprimento nos entrenós 4 e 5, em razão da aplicação do CCC, independentemente da dose usada (Fig. 3), comparativamente ao controle (sem aplicação de CCC). Por sua vez, a cultivar BR 32 apresentou maior redução no 3º e 6º entrenós com aplicação de Cycocel (Fig. 3). A cultivar BR 35, diferindo das demais, apresentou resultado marcante na redução de estatura quando se aplicou a dose de 8 l/ha, em comparação com a dose de 2 l/ha (Tabela 7). Esse maior efeito na redução de estatura, pela dose de 8 l/ha, na cultivar BR 35, provocou efeito diferenciado no encurtamento de entrenós. Com 8 l/ha, todos os entrenós a partir do 3º foram encurtados, ao contrário do que ocorreu com 2 l/ha, em que o 3º e o 4º entrenós foram os mais encurtados (Fig. 4). Já para a cultivar CEP 21, a maior redução de estatura ocorreu com aplicação de 4 e 8 l/ha (Tabela 6) e o efeito no encurtamento de entrenós foi observado a partir do 2º entrenó (Fig. 4).

 

Deficiência hídrica

A deficiência hídrica é fator ambiente que provoca redução de crescimento e, conseqüentemente, redução da estatura da planta. Nessas condições, provoca efeito semelhante ao do redutor de crescimento. Dessa forma, a aplicação de redutor de crescimento, em caso de ocorrência de deficiência hídrica, seria contra-indicada.

 

Dose e aplicação

Resultados obtidos com várias cultivares de trigo, em estudos realizados na Embrapa Trigo, mostram que a aplicação de redutor de crescimento constitui prática de manejo eficiente na redução de acamamento. A melhor eficiência dessa prática está restrita às cultivares de porte alto, com tendência a acamamento, em solos de alta fertilidade. Para tal propósito, dose de 1.000 g i.a./ha (2 l/ha de Cycocel-500 A) é suficiente para provocar redução de acamamento. Para maior eficiência, a aplicação deve ser realizada sobre as folhas, embora o "CCC" possa ser absorvido pelo caule e pelas raízes.

Recentemente foi lançado um novo produto (Moddus) que possui atividade como regulador de crescimento em cereais e apresenta potencial de uso na redução da estatura de plantas, diminuindo, dessa forma, a probabilidade de acamamento e de perdas na produtividade associadas ao fenômeno. A dose recomendada para controle de acamamento em trigo é de 0,5 l/ha do produto comercial.

 

Compatibilidade

Os redutores de crescimento (ex., Cycocel-500 A e Moddus) são compatíveis com a maioria dos herbicidas, entre os quais o 2,4-D e o MCPA. O uso conjunto desses produtos representa uma redução de custos de aplicação. Ainda, o combate a plantas daninhas em áreas tratadas com reguladores de crescimento é desejável, uma vez que os reguladores têm efeito redutor de crescimento maior em trigo do que em plantas daninhas, e o não controle destas poderia deixar a cultura de trigo mais suscetível à competição.

 

Box 1

Acamamento: suplemento excessivo de nitrogênio

O suplemento excessivo de nitrogênio (N) aumenta mais o crescimento da parte aérea, comparativamente ao crescimento radical, ampliando a suscetibilidade da planta à seca e a deficiência nutricional de fósforo e potássio. O alto suplemento de nitrogênio promove excessivo crescimento de área foliar (IAF), pelo seu efeito na expansão da área foliar e pelo aumento do afilhamento. Essas condições podem levar ao auto-sombreamento foliar e a um microclima favorável ao desenvolvimento de fungos. A infeção de fungos nessa situação é aumentada, pois sua penetração, multiplicação e desenvolvimento são potencializados em tecidos suculentos, como decorrência do suplemento excessivo de nitrogênio. Com o aumento na disponibilidade de nitrogênio, o efeito positivo deste na fotossíntese é diminuído, em razão do auto-sombreamento (estímulo à respiração) ou pelo aumento da infecção por patógenos. Em decorrência, verifica-se aumento da demanda de fotossintatos necessários à assimilação desse excesso de nitrogênio, o qual não é contrabalanceado por aumento na produção de carbono (açúcar) fotossintético. Dessa forma, os fotossintatos são desviados de outros caminhos dentro da planta para atender à nova demanda de assimilação, criada pelo excesso de nitrogênio, resultando em alteração na estrutura orgânica da planta. Como pode ser visualizado na Figura 5, essa alteração reflete-se na redução da disponibilidade de carboidratos para os processos estruturais da planta.


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