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Dezembro, 2009
Passo Fundo, RS

 


Introdução

A busca por aumento de produtividade de sistemas agrícolas produtivos alicerçada no conceito de fertilidade do solo, notabilizada por parâmetros de natureza química e pelo uso intensivo de fertilizantes minerais, vem sendo substituída pela implementação das diretrizes da agricultura conservacionista, cenário em que a ampliação do conceito de fertilidade do solo assume relevância (DENARDIN & KOCHHANN, 2006; D’AGOSTINI, 2006; NICOLODI, 2006, 2007). Nesse contexto, a otimização de sistemas agrícolas produtivos, embasada em gestões incompatíveis com a promoção da fertilidade biológica, física e química do solo, indubitavelmente, mostra-se dessincronizada ante a expectativa de alcance de uma agricultura tendente à sustentabilidade (DENARDIN & KOCHHANN, 2006).

Na ampliação da base conceitual de fertilidade do solo, em que a estrutura do solo desempenha papel preponderante, a quantidade e a qualidade do material orgânico gerado e a frequência de aporte deste material ao solo constituem referencial para a gestão de sistemas agrícolas produtivos. Sob esse enfoque, observa-se que enquanto às características estruturais das plantas – raiz e palha – estão reservadas a qualidade e a quantidade de carbono orgânico produzido, à frequência de porte de fitomassa ao solo – número de safras por ano agrícola – está reservada a estabilização da atividade biológica do solo, fatores estes responsáveis pela qualidade estrutural do solo e, consequentemente, pela definição do padrão de fertilidade biológica, física e química do solo. Portanto, a integração do trinômio quantidade, qualidade e frequência de fitomassa aportada ao solo está, indissociavelmente, vinculada ao modelo de produção praticado e às interferências sinérgicas de equipamentos agrícolas de manejo de solo que auxiliam no desenvolvimento e aprofundamento do sistema radicular das plantas cultivadas (DENARDIN, 2009). De outra forma, a fertilidade integral do solo está diretamente associada à dinâmica dos fluxos de adição e de mineralização do material orgânico aportado ao solo pelos modelos de produção, em decorrência da gestão do sistema agrícola produtivo, com ênfase para: diversidade e arranjo temporal das espécies que compõem os modelos de produção; distribuição espacial das plantas no campo; intensidade de mobilização do solo; quantidade, qualidade e posicionamento de corretivos e fertilizantes no solo; e prevenção de perdas por erosão, lixiviação, volatilização, eluviação etc. Assim, enquanto a intensidade de mobilização do solo e a quantidade, a qualidade e o posicionamento dos corretivos e fertilizantes no solo estão associados à aceleração da taxa de mineralização do material orgânico aportado ao solo, a distribuição espacial, a diversidade e o arranjo temporal das espécies, determinados pelo modelo de produção adotado, estão associadas à quantidade e à qualidade da matéria orgânica resultante no solo (DENARDIN & KOCHHANN, 2006). Desse modo, é possível inferir que o nível de fertilidade integral do solo, ao contemplar aspectos biológicos, físicos e químicos, é determinado, fundamentalmente, pela estrutura do solo, que rege os parâmetros determinantes da capacidade de armazenamento e de disponibilidade de água, da capacidade de armazenamento e de difusão de calor, da permeabilidade ao ar, à água e às raízes, do nível de acidez e da disponibilidade de nutrientes do solo (DENARDIN & KOCHHANN, 2006; VEZZANI & MIELNICZUK, 2009).

É inquestionável que a otimização de sistemas agrícolas produtivos, com a propriedade de promover emergência de fertilidade no solo, é viabilizada pela implementação da agricultura conservacionista, enquanto conceituada como um complexo de processos tecnológicos de enfoque sistêmico, que objetiva preservar, melhorar e otimizar os recursos naturais, mediante o manejo integrado do solo, da água e da biodiversidade, compatibilizado com o uso de insumos externos (DERPSCH & BENITES, 2004; DENARDIN, 2009). No Brasil, essa abordagem vem sendo contextualizada no âmbito do sistema plantio direto, fundamentado na mobilização de solo apenas na linha de semeadura, na manutenção permanente da cobertura do solo, na diversificação de espécies via rotação e/ou consorciação de culturas e na minimização do intervalo entre colheita e semeadura, em um processo contínuo colher-semear. Sistema plantio direto, portanto, é interpretado como ferramenta da agricultura conservacionista para imprimir sustentabilidade ao desenvolvimento agrícola (DENARDIN & KOCHHANN, 2006).

Sob a ótica da ampliação da base conceitual de fertilidade do solo, o processo de avaliação do nível de fertilidade em um solo encontra desafios não apenas na seleção de indicadores mas, na heterogeneidade intrínseca do solo, decorrente de fatores naturais de formação do solo, e na heterogeneidade efêmera, temporária e transitória resultante de interferências antrópicas, que influem na amostragem do solo e na interpretação dos resultados analíticos. No âmbito do sistema plantio direto, em que as interferências antrópicas, decorrentes da mobilização de solo limitada à linha de semeadura, da deposição de corretivos e fertilizantes na superfície do solo ou na camada superficial do solo e do posicionamento recorrente das linhas de semeadura no terreno safra após safra, essa heterogeneidade é ainda mais acentuada, seja verticalmente no perfil do solo, seja horizontalmente na superfície do solo (CAVALCANTE et al., 2007; SOCIEDADE..., 2004). Nesse sentido, é evidente que a aleatoriedade empregada no processo de amostragem de solos manejados sob preparo convencional tornou-se inadequada à aplicação em solos manejados sob sistema plantio direto.

Em atenção a esse aspecto, a amostragem de solo, objetivando subsidiar a calagem e a adubação nos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, abandonou a aleatoriedade, passando a ser orientada pelas linhas de semeadura da cultura anterior (SOCIEDADE..., 2004). Em referência à amostragem de solo para avaliação de atributos físicos do solo, não há, ainda, plena percepção desse problema de heterogeneidade. É notório o expressivo número de trabalhos que mantém coleta de amostras de solo com aleatoriedade horizontal e definição de camadas a serem amostradas independentemente da estratificação estrutural do perfil de solo. Resultados de análises físicas de solo, oriundos de amostragens sem esse tipo de discernimento, podem estar induzindo a interpretações imprecisas e comprometedoras a tomadas de decisão.

Portanto, o objetivo desse estudo foi avaliar o quanto diferentes espécies vegetais cultivadas em linha imprimem heterogeneidade física a um solo manejado sob sistema plantio direto.


 

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